Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 6º Volume | Page 27

A foraclusão consistiria, então, na suspensão de qualquer resposta à solicitação dirigida a um sujeito, de ter que fornecer uma mensagem, praticar um ato, ou instituir um limite. Por isso, a foraclusão é a não vinda desse significante no lugar e no momento em que ele é convocado a advir (apelo ao simbólico).

Os efeitos da foraclusão podem ser dois: os distúrbios no simbólico e os distúrbios no imaginário. Quando a foraclusão se verifica, ou seja, quando o Nome-do-Pai não surge ali onde ele era esperado, segue no sujeito psicótico uma série de remanejamentos de elementos simbólicos (como se estivessem “mancos”). Lacan sustenta que o problema fundamental no processo de uma psicose não é tanto o da perda da realidade (conforme acreditava Freud), mas o mecanismo de formação da nova realidade que vem substituí-la.

O paciente psicótico tem a certeza, não do caráter autêntico desta ou daquela realidade, mas do fato de que esta realidade diz respeito a si. Por isso, o que é incontestável não é a realidade em si, mas o fato dela ser do sujeito. A chamada “certeza psicótica” reside, portanto, na convicção absoluta e espontânea de que tal realidade é “minha” realidade e o eu, seu único agente.

Refletindo sobre a psicose a luz do caso Apolo

Apolo foi concebido quando sua mãe estava com a cabeça voltada para o lixo. Fruto de uma violência que talvez o tenha marcado por toda a vida. Após uma série de tentativas de aborto, a mãe se tornou irmã. Não fosse sua avó, que também o agredia, talvez não tivesse sobrevivido.

Como pudemos acompanhar ao longo do capítulo anterior, a constituição psíquica está atrelada ao desejo e, dessa maneira, à relação daquele que cuida com o bebê. Ao refletirmos sobre os primeiros momentos da história de vida de Apolo, chama-nos atenção a ausência de uma antecipação desejante que pudesse oferecer a esse bebê um lugar no mundo. Ele não foi, a princípio, desejado, esperado, imaginado. Ele não tinha, ao que nos parece, e usando suas próprias palavras, “uma morada” (sic.).

O primeiro tempo do Édipo enfatiza justamente a importância desta relação inicial mãe-bebê, uma relação estritamente dual. Dessa forma, consideramos que esta mãe talvez estivesse impossibilitada de estabelecer um tipo de relação considerado “adequado” para com este bebê. Ainda muito nova e no papel de filha, é possível que não tivesse alternativa que não ter se tornado irmã e entregado o filho à própria mãe. Passou a odiar homens, mas tem justamente um filho homem, escancarando, quiçá, a violência sofrida.

A violência também se repetiu no cuidado da avó que agredia Apolo frequentemente e também quanto ao suposto pai. Conforme seu próprio relato, não sabia quem ele era, nem ao menos o seu nome, apenas que ele havia estuprado sua mãe/irmã. Uma referência paterna, portanto, que falhou.

PATHOS / V. 06, n.04, 2018 26

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