Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 6º Volume | Page 24

O caso Apolo nos despertou para o campo da psicose especialmente no que tange aos primórdios da formação psíquica. Conforme pudemos acompanhar, por meio do relato a respeito do começo de sua história de vida, alguns dados podem ser considerados como reveladores daquilo que permeia a constituição psicótica. Aspectos como o de sua concepção ter se dado por meio de um estupro, ou seja, de não ter sido a princípio “desejado”, a possível ausência de uma figura representativa do pai, o aspecto marcante e complexo de sua identidade, sua ânsia por encontrar uma “morada, um lugar no mundo” (sic.) e, finalmente, a forma com que ele lidou com suas perdas.

Três tempos do Édipo

Quando nasce o bebê, a sua dependência é total em relação ao outro, podendo ou não esse outro ser a mãe biológica. A mãe, neste momento, é tudo para a criança, já que responde a todas as suas necessidades. Neste primeiro momento, a criança acredita que é o próprio falo, isto é, aquilo que completa a mãe. A mãe, se ela mesma passou pelo Complexo de Édipo e pôde reconhecer a sua castração, então também conseguirá procurar algo para além dessa criança (seu bebê) que possa fazer com que ela se sinta satisfeita, podendo simbolizar o bebê como falo1 (MORETTO, 2001).

Dessa forma, se o bebê é um objeto de desejo para a mãe e ela pode buscar algo fora desta relação dual (o que condiz com uma relação, a princípio, “sem lei”), então a mãe pode lhe ditar a lei, permitindo sair desta relação dual inicial (Quinet, 2011). Conforme salienta Moretto (2001) essa saída depende da mãe, de modo que a criança encontra-se sujeitada porque não é “sujeito” ainda, pois o seu desejo ainda é o desejo da mãe.

Dessa maneira, nesse primeiro momento, “a mãe é ‘Tudo’ e ‘Toda’ para a criança”, ou seja, ela é o Outro da criança (Leite, 1992, p. 70). No entanto, sobre essa função materna, sobre essa célula primordial constituinte do ser, algo vai atuar produzindo a separação entre a criança e a mãe. De alguma maneira a mãe vai deixar de ser “Tudo” e “Toda” para a criança. Como detalharemos adiante, será o significante do Nome-do-Pai que irá barrar este Outro absoluto representado pela mãe. A mãe, então, será “não toda” (Ibid., p. 76).

Ainda neste primeiro tempo, encontra-se o que Lacan formulou como sendo o “estádio do espelho”, o que seria correspondente à formação do eu por intermédio da imagem do outro. A unidade do corpo é prefigurada pela imagem do espelho e essa imagem primeira corresponde, segundo Quinet (2011), ao eu-ideal, através do qual o sujeito se apreende como humano.

PATHOS / V. 06, n.04, 2018 23

Σ