Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 5º Volume | Page 59

PATHOS / V. 05, n.03, 2017 58

Σ

Com a intenção de interagir com o paciente ou seus familiares/acompanhantes, os palhaços muitas vezes utilizam características pessoais destes, procurando enaltecer qualidades ou então usar como recurso de humor. Neste sentido é válida a aparência física, ou mesmo dados pessoais, como quantidade de filhos ou netos, idade ou do lugar onde nasceram. Para exemplificar momentos em que os palhaços utilizaram características enaltecendo o atendido, pode-se destacar uma situação em que o palhaço A1 elogia a cor dos olhos de um senhor dizendo que o paciente deveria fazer muito sucesso na juventude e o paciente demonstrou gostar do elogio. Outra maneira de obter o riso dos atendidos se refere a comentários que os palhaços fazem a respeito deles mesmos ou então de outro palhaço que está no mesmo ambiente, utilizando este recurso principalmente em situações onde os pacientes demonstram maior timidez ao interagir ou reserva em falar de si. É possível citar um atendimento onde o palhaço comparou sua beleza à de um ator famoso do cinema ou em outra situação, onde os palhaços brincaram a respeito da estatura de um dos integrantes da equipe, fazendo piadas a respeito. Conforme Ferreira (2013), o indivíduo, a partir do momento que assume a identidade do palhaço através da sua maquiagem e acessórios característicos, torna-se um transgressor dos valores vigentes, expondo-se como ser humano; faz de sua inadequação, do ridículo e fraqueza formas de desviar os olhares do outro das exigências de padrões vigentes. Esta liberdade ante o que se é esperado socialmente permite uma atuação imprevisível por parte do palhaço; podendo ir do terno ao rebelde, do alegre ao triste em questão de segundos, sem chocar o expectador. E a partir daí são quebradas as barreiras do expectador, que se mostra propenso ao transporte, mesmo que momentâneo, do alívio que o riso promove.

Embora nas demais unidades de significado do uso de piadas, charadas e afins também tenham sido apresentadas, devem-se apontar algumas situações em que tornaram-se protagonistas da interação. Foram observadas situações onde os palhaços se diziam especialistas em charadas, e perguntavam a resolução destas para os pacientes, a maioria com conteúdo ingênuo ou sem lógica muito aparente. Morais (2008), ao fazer sua leitura do livro de Freud dedicado ao chiste (1905), indica que pelo raciocínio do autor o chiste é estruturado no inconsciente e por este motivo torna-se trânsito para que algo de seu conteúdo recalcado muitas vezes venha à tona, protegido pelo humor que o chiste intenciona; uma brincadeira de faz-de-conta que pode até conter algo de verdadeiro no conteúdo, mas que o sujeito ao qual a piada é endereçada, desconsiderada em prol da descarga de tensão que o riso oferece.