Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 5º Volume | Page 47

PATHOS / V. 05, n.03, 2017 46

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Teme que ao se colocar de forma agressiva, suas relações podem não sobreviver pois não sente confiança na sua capacidade de repará-las. A crença na reparação é fundamental para que a pessoa guarde a fé de que o mundo corresponde a sua capacidade criativa, permitindo a manifestação espontânea do SELF – um sinal da saúde do indivíduo.

Apesar da dificuldade em compreender, Macabea percebe sua ambivalência emocional, como pode-se constatar em seu relato de uma festa a fantasia para qual a mesma teria sido convidada. Macabéa relata que teria levantado animada e decidida a confeccionar sua própria fantasia. Decidira ir vestida de boneca Emília e então dirigiu-se a loja de tecidos para comprar um tecido colorido. No dia da festa, ela planejou acordar cedo para costurar sua fantasia, no entanto, o namorado solicitou que ela o acompanhasse a um serviço que ele deveria fazer. Devido a insistência do namorado, Macabéa o acompanhou, mas com a promessa de que voltariam a tempo para que ela pudesse confeccionar a fantasia. Macabéa e o namorado não retornam em tempo para que ela pudesse costurar a fantasia de Emília, o que a leva a ir com uma roupa de freira para a festa. Perguntamos porque queria ir de Emília e a mesma nos responde “Emília é sapequinha, terrível! Acho ela demais, superdivertida! ” (sic) com isso, vemos a vontade de Macabéa posta de lado em prol da vontade do outro. A mesma vai à festa de freira, o oposto simbólico de Emília – a freira é casta, reservada, “coberta” (sic).

Nossa última sessão antes de longas férias foi o dia eleito para a entrega de um presente que poderia servir de espelho ou objeto transicional para Macabéa durante as férias. Diante do afastamento promovido pelas férias, o presente poderia cumprir este papel. No caso, um porta retrato com uma grande foto colorida da boneca Emília e no canto superior, uma pequena freira – objeto que foi retirado da fala de Macabéa, e que foi compreendido por nós, também como o objeto da sua busca.

No retorno das férias Macabéa nos pareceu diferente, pela primeira vez nos chama pelo nome, nomeia o namorado e as pessoas da família, demonstrando nos considerar como separadas dela e perceber o mundo de forma mais objetiva. A fala de Macabéa, também é percebida numa apresentação mais organizada após as férias.

Quando é ofertado a ela um atendimento a mais na semana, a paciente responde que não precisa, que “aguenta esperar” (sic), atestando pela confiabilidade conquistada na relação terapêutica. Se mostra mais à vontade no setting – como um bebê que se esparrama na certeza de ser sustentado.