Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 5º Volume | Page 31

PATHOS / V. 05, n.03, 2017 30

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Diante desse cenário, fazia uma tentativa de esclarecimento da nossa atuação, o que se transformava num trabalho de persuasão, de convencimento da inviabilidade da proposta clínica e da possibilidade de intervenção institucional. Desta forma, as resistências, as dificuldades de mudança, e os diversos questionamentos eram constantes. Mas, meu método de trabalho estava traçado: observações em sala de aula, entrevistas com família, professores... E, foi especialmente em sala de aula que pude reviver os momentos agradáveis dentro do ambiente escolar, mas também os desapontamentos que esta instituição pode provocar na vida escolar de uma criança.

Em uma das instituições, foi-me apresentado um ‘caso’ de uma criança do quarto ano do ensino fundamental, que possuía dificuldades de alfabetização. Esta criança em outras disciplinas se desenvolvia muito bem, mas quando chegava a tal da Língua Portuguesa, a confusão se instalava e a criança não conseguia prosseguir. A direção e a coordenação relatavam o caso com certa perplexidade, dizendo que já tinham feito de tudo, mas não conseguiam que a criança lesse e escrevesse. Sendo assim, o que mais precisavam era de um diagnóstico, dizendo qual seria o ‘problema’ dessa criança.

De acordo com o exposto, fui à sala de aula realizar a observação, e o que vi foi uma criança quieta, com relativa comunicação com seus colegas de classe. Um desses colegas, próximo do fim da aula, mostrou-me um caderno que continha muitos desenhos, de autoria dele e da criança. Estes desenhos eram muito bem feitos, elaborados, com traçado firme, demonstrando aí a sua grande habilidade artística. Em conversa com a professora, a mesma colocou que, no momento, em que tentou se utilizar de outra forma na tentativa de alfabetizar a criança, foi barrada pela direção. Inclusive, sua aula acontecia de maneira tradicional: leitura do livro, acompanhado pelos estudantes, com baixa interação entre ela e as crianças.

Na segunda etapa, fui conversar com a família representada pela figura do pai. Este, mostrou-se preocupado com o desempenho escolar do filho, mas ressaltava as potencialidades que conseguia observar no mesmo: a habilidade para desenhar, para jogos e, por isso, não acreditava que fosse apenas responsabilidade de seu filho a dificuldade de aprendizagem. Notava que a instituição, na verdade, não sabia lidar com a criança, e em uma reunião de pais, pontuou que na sala apenas uma criança não apresentava desenvolvimento satisfatório, expondo de modo desnecessário, seu filho. Esta reunião, segundo o pai, foi pautada por gráficos, dados, ou seja, números, provas de que seu filho estava ‘fora’ do que a escola tinha como objetivo.