Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 3º Volume | Page 8

Desde a introjeção, considerada impossível, a passagem decisiva à incorporação se efetua, pois, no momento em que, não vindo as palavras da boca a preencher o vazio do sujeito, este introduz no seu lugar um coisa imaginária. (Abraham e Torok, 1995: 247)

1- O caso e os indícios do traumático

Edna foi encaminhada para tratamento psicológico pelo serviço de pediatria de um posto de saúde. A ficha de acolhimento1 apresentava a seguinte anotação: “Criança vomita por qualquer coisa com muita facilidade. Quando bebê sempre vomitava. Atualmente o vômito tem a função de prender a mãe sempre junto a ela”.

O apelo dos pais girava em torno da contenção dos sintomas, dos quais o vômito se destacava. Este era um problema a ser aplacado e sob a “ameaça”, do médico que a acompanhava, de entrar com a prescrição de “calmante”, se no período de seis meses Edna não melhorasse. Afirmação que deixava a mãe bastante apreensiva e culpada.

Sabíamos estar diante de um desafio corriqueiro, nem por isso menos desafiador na análise com criança, ou seja, o da urgência dos pais de se verem livre do sintoma de seu filho, e o cuidado, bem como o tempo que precisamos para que o sintoma revele o seu verdadeiro estatuto. Aspecto que em si apresenta uma complexidade, e no caso de Edna, em particular, acrescenta-se a prematuridade com a qual o vômito aparece na história clínica desta criança, fato insistentemente apresentado pelos pais.

Quando bebê, a paciente era amamentada durante quarenta minutos à uma hora e vomitava todas às vezes sendo colocada no peito logo em seguida para nova amamentação, mantendo desta forma o peito sempre presente. Segundo os pais, Edna “sugava forte o peito” e parecia querer “dormir no peito”.

A mensagem: “mamãe não vai te abandonar”

A história da gestação desta criança foi marcada pelo medo da mãe em relação à reação do seu pai frente a sua gravidez que foi escondida até a cerimônia religiosa. Durante os nove meses de gestação a mãe conta ter vomitado constantemente, bem como sempre “dizia para a barriga”: “mamãe não vai te abandonar”. Mesmo depois que Edna nasceu sua mãe continuou repetindo esta mensagem. A amamentação entra neste circuito, como um lugar privilegiado no qual mãe e filha parece renovar a promessa da não separação.

PATHOS / V. 03, n.02, 2016 07

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