Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 2º Volume | Page 27

PATHOS / V. 02, n.01, 2015 26

Certa vez, o padrasto retornou do bar outra vez embriagado. Sua mãe ainda não havia chegado do trabalho. Mônica tinha onze anos nessa época. Era tarde da noite e, neste dia, para além das carícias, Mônica foi violentada física e sexualmente por ele. Do jeito que estava na cama ficou até o outro dia. Sua mãe não percebeu o ocorrido, ou pelo medo, manteve-se em silêncio. A violência continuou por alguns meses até seu padrasto ter sido assassinado em decorrência de uma briga num bar. No entanto, mesmo com a ausência dele e, por consequência das agressões, o assunto se manteve intocável pela família.

Sentindo-se deslocada dessa família, em meio a uma confusão de sentimentos, sem ter quem a acolhesse, iniciou uma empreitada em busca de sentidos para sua vida. Perdeu a concentração na escola, o gosto pelas brincadeiras e se afastou dos amigos. Aos 12 anos, passou a consumir maconha e aos 13 cocaína, fazendo uso quase que diário da droga. Envolveu-se com pessoas do tráfico, não propriamente pelo estilo de vida ou pelos ganhos financeiros dessa atividade, mas porque conseguiu sentir-se pertencendo a um lugar, sentia-se acolhida por aquele grupo. Nessa época, ficava dias fora de casa. Vivia na casa de amigos, passando a noite nas “biqueiras” ou em bailes funks. Entregava-se sem critérios ou proteção a relações sexuais com diversos parceiros. Não demorou a ser explorada sexualmente. Aos 15 anos, Mônica foi apreendida por ato infracional equiparado ao tráfico de drogas. Foi enviada ao Centro de Internação Provisória, no qual ficou 45 dias à espera da decisão judicial. O juiz, por sua vez, decidiu pela Medida Socioeducativa de Internação.

Mônica e sua história fazem parte de um caso fictício, “inventado” para ilustrar as vivências que frequentemente antecedem as internações. Qualquer semelhança é mera coincidência. Contudo, as semelhanças existem porque os elementos do caso de Mônica estão comumente presentes em casos reais. Há adolescentes com histórico de uso abusivo de drogas e, por isso, aproximaram-se do tráfico; outros que se entregaram à violentos rituais de entrada e permanência em determinados grupos de adolescentes; alguns com vivência de rua e outros que, permeados por histórias de violências e abusos responderam na mesma medida para lidar com seus sofrimentos. O adolescente, quando permeado por experiências de abandono afetivo e situações de violência física e sexual, cria meios para sobreviver ao caos, passando, muitas vezes, por situações que reiteram vivências de agressividades, como na exposição às situações de risco. O adolescente que cumpre Medida Socioeducativa de Internação apresenta frequentemente uma história de vida marcada por situações que ensejam sofrimentos, tanto por questões de ordem familiar quanto social.

Mas, de fato, o que determina a internação do adolescente? Antes, é preciso entender que existem outras Medidas Socioeducativas. De acordo com a Lei 12.594/12 (BRASIL, 2012), as Medidas Socioeducativas têm por objetivo a responsabilização quanto ao ato infracional, a desaprovação da conduta delitiva, bem como a integração social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais.