Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 11ºb Volume | Page 27

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Rodrigues (2017), ressalta que, no período pós-abolição da escravatura surge o conceito de “classe perigosa” como fundamento teórico necessário para legitimar os debates em torno do controle social no pós-abolição. E continua, ao citar Batista (2003b):

O medo de que a multidão de negros e pobres se tornasse absolutamente insubordinada e ociosa exigia a elaboração de medidas enérgicas. Assim, “a relação trabalho/ociosidade/criminalidade enriquecia o debate parlamentar por uma lei de repressão” às práticas consideradas perniciosas, que foram criminalizadas sobre os mais diversos nomes, como vadiagem, libertinagem, mendicância. Os espaços e atividades de sociabilidade dos negros também foram considerados perigosos. Neste sentido proibiram-se os batuques, os zungus, as manifestações religiosas de origem africana e a capoeira. (Rodrigues, 2017), p.132)

O primeiro Código de Menores brasileiro surge em 1927, com o Código Mello Mattos (Decreto 17.943-a, de 12 de outubro de 1927), reformado em 1979, que trazia uma proposta de “tratamento” ao abandono e à delinquência, sob o viés de classe social. Nesse sentido, crianças e adolescentes pobres eram os “menores” objeto de intervenção estatal. Batista (2003) aponta que nesse momento é que a palavra “menor” passa a se associar definitivamente a crianças pobres a serem tuteladas pelo Estado para preservação da ordem e asseguramento da modernização capitalista em curso. Esse código também traz, em seu artigo 136, que as

autoridades judiciais poderiam exercer vigilância na escola, em oficinas de trabalho, nos lares ou em qualquer outro lugar onde se achem os menores, dando aos juízes amplos poderes e discricionariedade inquestionável (Rodrigues, 2017, p.145).

Ainda nessa perspectiva, o Estado, por meio do Poder Judiciário, considerando o recorte temporal do Código de Menores de 1927, reproduz a Ideologia do controle de seus corpos “delinquentes” e sua presença indesejada é correspondida com punição a comportamentos equiparados à desordem, vadiagem e embriaguez, que eram motivadores de institucionalização, inicialmente, no Setor de Menores das Casas de Detenção e, a partir dos anos 30, no Serviço de Amparo ao Menor (SAM), na Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (Funabem), Fundação do Bem-Estar do Menor (Febens), entre outros, em ações que centralizavam a internação como forma de reabilitação.

PATHOS / V. 11, n.01, 2020 26