Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 11ºa Volume | Page 58

Ronaldo Coelho - Hoje a ideia é que a gente possa mostrar que mesmo nesse momento de pandemia faz sentido falar de racismo, faz sentido a gente falar a partir desse recorte da questão do sofrimento.

Andréia Alves - Sim, acho que ainda mais nesse momento onde todos estamos sofrendo, mas é inegável que alguns estão sofrendo muito mais que outros, considerando que a sociedade brasileira foi desenvolvida em cima de uma estrutura racista. Estrutura essa que coloca a população negra na base da pirâmide social, sem condições e oportunidades de ascensão. Onde a maior parte de nós negros está nas favelas, tem empregos subalternos, subempregos, tem que trabalhar de manhã para poder conseguir o alimento daquele dia. Enquanto algumas pessoas têm o privilégio de poder fazer isolamento social ou estar minimamente afastada fisicamente das outras pessoas, como orienta a Organização Mundial de Saúde, cientistas e especialistas da área da saúde, a maior parte da população negra não consegue seguir essa medida de proteção porque mora em casas muito pequenas, sem ventilação, muitas pessoas dentro de um espaço pequeno, muitos sem condições de comprar produtos de higiene, por vezes até mesmo sem água.

Ronaldo Coelho - Uma das coisas que tenho falado bastante nas minhas lives sobre esse momento de pandemia em relação ao uso dos espaços, é ter uma divisão na casa. Uma pessoa fica de manhã num quarto, outra em outro quarto, outra na sala, pensando nas pessoas que trabalham em casa. Mas percebo que quando penso e falo desta organização estou falando de uma casa que tenha esses cômodos todos, às vezes, como você está trazendo aqui, não tem. Como fazer quando moram algumas pessoas dentro de um lugar que não tem a possibilidade desse tipo de divisão? Como organizar esse espaço no momento em que todo mundo tem que ficar dentro de casa como medida de proteção?

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PATHOS / V. 11 n.01, 2020 57