Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 11ºa Volume | Page 28

Quarenta anos depois, o Estado Novo criava, em 1941, o Serviço de Atendimento ao Menor, (SAM), sistema que ajudou a criminalizar definitivamente o menor de rua. No primeiro quartel do século XX, a população de crianças carentes tinha que se defrontar com um binômio imposto pela sociedade burguesa: lazer versus trabalho e honestidade versus crime. Normalmente foram associadas ao trabalho e, na ausência deste, crime. Os rostos de crianças negras são os mais frequentes nas imagens mostradas sobre a Febem. (Priore, 2012, p. 238).

Nesse sentido, está mais do que delimitada a diferenciação entre a concepção e o tratamento dado à infância e adolescência na sociedade capitalista; o que é desejado e esperado para determinada classe social e, sobretudo, o direcionamento da ação estatal repressiva para determinados grupos. Para Ribeiro e Benelli (2017), a pobreza, entendida como resultado da exploração da mão de obra da população negra escravizada, coexistiu com a produção discursiva sobre as raças, que inventou e associou a delinquência à imagem do jovem negro perigoso. Entretanto, a condição social e o lugar periférico ocupado por jovens e adultos negros são comumente analisados a partir da perspectiva econômica, a qual se tem mostrado insuficiente para a compreensão da complexidade das práticas sociais e discursivas atuais.

O jovem negro representa o “elemento suspeito”, aquele cujas características correspondem à imagem fantasmagórica do homem negro brasileiro, construído no tecido social e mantido com o respaldo das instituições e estabelecimentos estatais, tais como a polícia, e com o apoio indispensável dos meios de comunicação. A periculosidade imagética e imaginária, que circunda o corpo negro, valida as práticas de racismo de Estado presentes nos equipamentos e nas instituições públicas. (Santos e Carneiro, 2015, citado por Ribeiro e Benelli, p.14, 2017).

Batista (2003), aponta, em seus estudos, sobre o primeiro processo julgado pelo juiz Mello Mattos, em janeiro de 1924, como o que seria a tônica do trabalho do juizado: analisar jovens negros e pobres acusados de crimes contra a propriedade:

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