Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 11ºa Volume | Page 19

A autora explica que se trata de uma estrutura vocacionada para atingir os crimes relacionados aos setores socialmente mais vulneráveis.

Cientes de que o sistema penal é um aparato deliberadamente projetado para não funcionar em sua máxima capacidade, há ainda um outro nível de sua intervenção que deve ser levado em conta, qual seja, o da seletividade qualitativa, considerada como outra condicionante fundamental na sua atuação. (Flauzina, 2006, p. 25).

As agências de criminalização primária1 preparam o aparato legal para que as agências de criminalização secundária operem a criminalização dos grupos e não necessariamente pelo dano social dos delitos cometidos que, em grande parte não se comparam aos efeitos produzidos por atos criminosos típicos da elite.

A exemplo disso podemos observar que o Sistema Juvenil Paulista tende a punir com privação ou restrição de liberdade, atos infracionais equivalentes aos crimes de roubo e tráfico de drogas, conforme dados do Boletim Estatístico da Fundação CASA2, onde 42,60% dos(as) internos(as) por tráfico e 38,49% por roubo qualificado. Neste aspecto é possível refletirmos sobre o debate em relação a defesa inclusive, do Estado Brasileiro3, de que o Tráfico de Drogas configura-se entre uma das piores formas de Trabalho Infantil, no entanto a criminalização da inserção de crianças e adolescentes nestes mercados informais ofertados pelo capitalismo contemporâneo, ainda é forma prioritária de lidar com esta questão, reforçando a culpabilização da classe trabalhadora pela inserção precária, insalubre e degradante dos mercados informais.

Os adolescentes que cometem atos infracionais, assim como adultos que praticam contravenções penais, estão envolvidos, no Brasil, no processo que Michel Misse (2010) chama reprodução social da sujeição criminal – isto é, quando se identificam certas características, perfis e locais como focos de suspeição. Com a ampliação do mercado de varejo de drogas, esse processo passou a marcar os adolescentes pretos, pobres e favelados, vistos como potenciais traficantes, enquanto as favelas passaram a ser identificadas como os território privilegiados desse processo. A sujeição criminal é um processo que supõe que a transgressão não é um atributo de acusação, mas um atributo do indivíduo transgressor, ou seja, o que o estaria em jogo, socialmente, não é punir o crime ou o ato infracional, mas punir o indivíduo concebido moralmente como incorrigível, “mau-caráter”, portador de uma essência criminosa e má, potencialmente irrecuperável e, no limite, que pode ser morto. (Almeida, Galdeano; 2018, p.18)

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PATHOS / V. 11, n.01, 2020 18