Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 10º Volume | Page 17

Iniciado no mês de julho de 2018, o grupo realizar-se-ia até o mês de dezembro do mesmo ano, perfazendo seis meses de duração. Com o período de recesso, foi estabelecido que os encontros do grupo seriam retomados em janeiro de 2019 para que fossem avaliadas as possibilidades de inserção de novas participantes e para dar continuidade aos encontros por mais seis meses. Esse foi o único grupo realizado no programa no ano, dada a ausência de mais participantes para a realização de um segundo grupo.

Ao compreender a importância da manutenção de um ambiente acolhedor para as vítimas, o programa oferece a todas as participantes um espaço de recepção com água, café, chá e bolachas. É nesse ambiente que as participantes do grupo se encontram e recepcionam as demais. Enquanto aguardam o início do atendimento, elas conversam sobre seus cotidianos e sobre as últimas informações jurídicas relativas a seus processos ou inquéritos.

Três componentes são mães que perderam seus filhos em ação policial. Uma é irmã de vítima por feminicídio e uma integrante teve seu marido executado enquanto retornava do trabalho, porém não possui respostas por partes das autoridades sobre a autoria do crime, demandando, portanto, assistência jurídica.

O referencial teórico psicanalítico serviu para nortear as intervenções realizadas junto ao grupo e para a articulação do sofrimento apresentado pelas vítimas com a dimensão política da violência na cidade. Violência que tem como alvo o corpo do cidadão:

A intrusão de um corpo sobre o outro ao demonstrar claramente uma perturbação, é também o sinal, a prova e o sintoma de uma desordem. Sempre que alguém é assassinado, espancado, torturado, sequestrado, detido, removido, é da cidade sem cidadania que lembramos. Da ausência de intermediações eficazes, capazes de impedir desfechos, nos quais se objetiva ferir o corpo, desapropriando-o de singularidade e autonomia, por meio da violência (ENDO, 2005, p. 65).

Segundo Ávila (2009), esse referencial também sustenta a concepção de que o indivíduo não existe em si ou para si mesmo. O autor lembra a importância do lugar do outro como elemento constitutivo do sujeito, utilizando como exemplo o filme “Náufrago”, com Tom Hanks, no qual o personagem cria um outro para continuar existindo. Tal alusão é oportuna, pois vem ao encontro da fala de uma das vítimas atendidas pelo grupo que, ao caracterizá-lo, afirmou: somos todas sobreviventes de um naufrágio.

PATHOS / V. 10, n.03, 2019 16

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