O lugar da Memória em Bento Rodrigues – Mariana / MG O lugar da memória em Bento Rodrigues | Page 38
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Diante de todos os dados e conteúdos analisados ao longo do
trabalho, seja por meio de fontes orais, referências teóricas ou
observação, pode-se antever que o curso natural para Bento
Rodrigues será a preservação do território, visto que há a pretensão
de se reivindicar o tombamento nas esferas estadual e federal, o que
se complementa com a possível construção de um memorial no local,
como tentativa de reparação histórica aos moradores atingidos de
forma tão severa.
Após o lançamento das propostas, espera-se atender às demandas
da população sobre o território, sendo uma forma de honrar a vida e
as memórias de Bento. A conexão profunda entre os moradores,
evidenciada por meio dos relatos, e o vínculo de identidade das
pessoas com o lugar, a chamada topofilia, reafirmada pelo retorno
constante dos moradores ao local que habitavam, apenas reforçam
o objetivo a que o trabalho se propõe.
Fica claro que, mais do que bens materiais, a população de Bento
perdeu todas as referências territoriais, modos de interação com o
território, forma de vida a que estavam habituados e demais perdas
imateriais. Segundo Yi-Fu Tuan: “Além da roupa, uma pessoa no
transcurso do tempo investe parte de sua vida emocional em seu lar
e, além dele, ser despejado pela força da própria asa e do bairro é
ser despido de um invólucro, que devido a sua familiaridade protege
o ser humano das perplexidades do mundo exterior”. (TUAN, 1980, p.
114)
É possível uma reconstrução do laço perdido? A já chamada
“Nova Bento” representará uma forma de reparação material para as
pessoas atingidas, mas não suficiente. As perdas imateriais, aquilo que
constitui a cultura e identidade da população, não serão
compensados. A construção de senso de passado é essencial, num
local cujo valor histórico e afetivo é evidente, atuando como prova
de um passado do qual o território fez parte, onde a memória ainda é
materializada e imaterializada. Para Tuan, “A consciência do passado
é um elemento importante no amor pelo lugar. A retórica patriótica
sempre tem dado ênfase às raízes de um povo”. (TUAN, 1980, p. 114)
Os antigos moradores, legítimos mantenedores da memória, são
também produtores dos vestígios necessários à reconstrução simbólica
e de significado. A reconstrução identitária, como comunidade, só se
dará partindo de uma reparação justa, na qual para a superação do
desastre se busque alternativas que considerem a reconstrução das
lembranças coletivas inseridas no contexto atual, prezando pela
manutenção das particularidades locais. Trata-se de uma luta
daqueles que buscam dignidade e que nos deixam perceber uma
notória “vontade de memória”. Há que se ter um senso de justiça
coletiva na busca de reparações que visem esse direito, atentando-
se, todavia, para o risco eminente do esfacelamento dessa memória,
dado o desgaste pelo qual passa essa comunidade desde novembro
de 2015.
Figura 102: Manifestação
na escola de Bento
Rodrigues. Fonte:
www.gazetaonline.com.br
/noticias/cidades/2016/11
/tragedia-no-rio-doce-
cruzes-para-pedir-justica-
1013993341.html
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