O imprevisível 2018 PD49 | Page 63

Lembrar o discurso de Fernando Henrique, proferido em 1994, avulta o contraste entre o caráter construtivo dos seus governos e a Era Lula. Durante os seus dois mandatos, as dire- trizes então anunciadas ensejaram transformações em diversos setores da economia, nas políticas públicas e na própria estru- tura do Estado. A partir de 2003, muitas dessas mudanças foram mantidas, mas perderam nas ações dos governos de Lula e Dilma o nexo que ligava o Estado, a economia e a sociedade como esferas diferenciadas da formulação originária de 1994, cujo foco era o desenvolvimento econômico sustentável na circunstância da globalização visando assegurar uma sociedade aberta e de cultura política liberal-democrática. Ao contrário, na visão que hegemonizará as atuações dos governos petistas vai predominar a questão da posse do aparelho do governo como base para um regime social de outro tipo. A participação do PT, inclusive dos movimentos sociais, nas estru- turas estatais passará a ser mobilizada em termos de uma ocupa- ção de mais e mais áreas do Estado. Para isso concorria o fato de seus principais protagonistas não terem compromisso com a democracia política, pois sempre desconheceram a questão demo- crática posta na esquerda brasileira, há muitos anos atrás. Chama atenção o traço – próprio do populismo – de os gover- nos de Lula e Dilma não darem valor fundamental às transforma- ções da esfera propriamente produtiva que era o cerne do programa de Fernando Henrique de 1994. O desinteresse por este tipo de reestruturação de sentido construtivo é o que, além das vicissitu- des que advêm da crise da economia internacional, sobretudo no governo de Dilma, leva, afinal, à desorganização da economia e de outras áreas da vida nacional ao fim da Era Lula. Também são expressivos daquela visão de poder o apelo do “nós e eles” com que Lula e o PT, ao longo do tempo, procuraram polari- zar a vida social e política do país, e o fato de o segundo governo de Dilma, isolado politicamente em 2016, recorrer à mobilização das suas próprias forças para dentro de si como forma de luta contra os que considerava seus inimigos externos. As avaliações oficiais do PT, feitas logo após o impeachment da presidente Dilma, lamen- tando não ter radicalizado aquela estratégia de poder, revelaram que o esgotamento da Era Lula foi o fracasso de uma experiência assemelhável a uma revolução nacional-popular. Desenvolvimento e democracia no discurso de FHC 61