Lembrar o discurso de Fernando Henrique, proferido em
1994, avulta o contraste entre o caráter construtivo dos seus
governos e a Era Lula. Durante os seus dois mandatos, as dire-
trizes então anunciadas ensejaram transformações em diversos
setores da economia, nas políticas públicas e na própria estru-
tura do Estado. A partir de 2003, muitas dessas mudanças
foram mantidas, mas perderam nas ações dos governos de Lula
e Dilma o nexo que ligava o Estado, a economia e a sociedade
como esferas diferenciadas da formulação originária de 1994,
cujo foco era o desenvolvimento econômico sustentável na
circunstância da globalização visando assegurar uma sociedade
aberta e de cultura política liberal-democrática.
Ao contrário, na visão que hegemonizará as atuações dos
governos petistas vai predominar a questão da posse do aparelho
do governo como base para um regime social de outro tipo.
A participação do PT, inclusive dos movimentos sociais, nas estru-
turas estatais passará a ser mobilizada em termos de uma ocupa-
ção de mais e mais áreas do Estado. Para isso concorria o fato de
seus principais protagonistas não terem compromisso com a
democracia política, pois sempre desconheceram a questão demo-
crática posta na esquerda brasileira, há muitos anos atrás.
Chama atenção o traço – próprio do populismo – de os gover-
nos de Lula e Dilma não darem valor fundamental às transforma-
ções da esfera propriamente produtiva que era o cerne do programa
de Fernando Henrique de 1994. O desinteresse por este tipo de
reestruturação de sentido construtivo é o que, além das vicissitu-
des que advêm da crise da economia internacional, sobretudo no
governo de Dilma, leva, afinal, à desorganização da economia e de
outras áreas da vida nacional ao fim da Era Lula.
Também são expressivos daquela visão de poder o apelo do “nós
e eles” com que Lula e o PT, ao longo do tempo, procuraram polari-
zar a vida social e política do país, e o fato de o segundo governo de
Dilma, isolado politicamente em 2016, recorrer à mobilização das
suas próprias forças para dentro de si como forma de luta contra os
que considerava seus inimigos externos. As avaliações oficiais do
PT, feitas logo após o impeachment da presidente Dilma, lamen-
tando não ter radicalizado aquela estratégia de poder, revelaram
que o esgotamento da Era Lula foi o fracasso de uma experiência
assemelhável a uma revolução nacional-popular.
Desenvolvimento e democracia no discurso de FHC
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