O imprevisível 2018 PD49 | Page 193

Kautsky ou David Riazánov – nunca se limitou a uma questão de competências técnicas ou intelectuais, mas que respondeu, sobre- tudo, a uma questão de autoridade. Na hora de por em circulação uma nova obra, a pergunta de fundo girava em torno de que pessoa (Engels, Kautsky etc.) ou instituição (o SPD, o Instituto Marx-Engels-Lenin de Moscú etc.) possuía a suficiente autoridade para dar à luz aquilo que Marx tanto resistiu a mostrar, para juntar os fragmentos que o próprio autor não havia conseguido integrar em um todo, para completar seus pontos suspensivos ou suas frases inacabadas. O caso da história das edições de O capital oferece um plus de sentido a respeito da publicação de qualquer outro livro. Pois de todas as obras profanas que os reformadores sociais do século 19 destinaram à emancipação do proletariado, só O capital alcançou semelhante nível de consagração. Um livro ao mesmo tempo complexo, cujo alto nível de abstração teórica fez que fosse mais reconhecido (e inclusive venerado) que lido. Isto fez com que sua edição, sua apresentação, sua própria leitura excedessem a relação simples, direta e profana entre o leitor e um livro qualquer. O acesso do leitor a uma obra como O capital devia ser mediado por toda uma série de pessoas e instituições “autorizadas”, que ofereceram garantias de canonicidade e fidelidade a um original zelosamente resguardado. E assim como a Bíblia judeu-cristã esteve submetida durante séculos às querelas por sua canonici- dade, o século 20 deu lugar a uma querela não menos intensa a respeito da “edição autorizada” da “Bíblia do proletariado”. Primeiros passos A edição original do primeiro volume de Das Kapital apareceu em Hamburgo, em 1867, com uma tiragem de 1.000 exemplares. Una segunda versão, corregida pelo próprio Marx, apareceu em fascícu- los entre junho de 1872 e maio de 1873. Se na capa está “1872”, o posfácio de Marx, datado de 24 de janeiro de 1873, prova que foi, nesse ano, quando terminou de imprimir-se (o volume completo não saiu para a venda senão em meados deste último ano). Uma terceira edição “ampliada”, a cargo de Engels, veio à luz em 1883, pouco depois da morte de Marx; ali se incorporavam as correções manus- critas que seu autor havia realizado sobre seus exemplares da segunda edição alemã e da edição popular francesa. Aos 150 anos de O capital 191