Por outro lado, mudanças corporais
sempre foram vistas por uma ótica
preconceituosa e discriminatória, tendo
em vista, sobretudo, os parâmetros
conservadores que sempre guiaram a
sociedade ocidental — capaz de ter
registrado, em sua história mais recente,
casos violentos contra transexuais, gays
e travestis.
“Com 19 anos, eu fiz a minha operação
de mudança de sexo no Brasil, no Rio de
Janeiro, porque se eu fizesse na
Tailândia minha mãe não poderia me
acompanhar. Ela ficou cinco dias
dormindo comigo e emagreceu porque
fazia a mesma dieta que eu fazia. Com
três meses tudo cicatrizou. Mas o
processo todo durou um ano”, diz
Marcela sobre o pré e o pós-operatório e
a ajuda de sua mãe Claudia.
Um passo à
ente
Porém para um transexual se sentir
bem, antes é necessário que ele alcance
o ideal de gênero que ele entende ser, o
que consequentemente o “desfavore-
ce” no mercado de trabalho, que é na
maioria das vezes restritivo e normali-
zador, como de igual modo parece estar
a sociedade contemporânea.
É verdade que durante muito tempo
indivíduos transexuais eram tratados
como “doentes”, uma vez que o termo
estava classificado no CID (Classifica-
ção Internacional de Doenças) como
um Transtorno de Identidade Sexual.
Mas, hoje, esse tipo de situação vem se
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tornando cada vez mais pálida — graças
a trabalhos como o da cartunista Laerte
e do deputado Jean Willys, além do
Ambulatório de Saúde Integral para
Travestis e Transexuais em São Paulo.
Marcela é reflexo dessa mudança, já que
seu trabalho tem grande visibilidade,
sobretudo no Instagram. O mundo da
moda, como um sistema, tem seu próprio
ritmo e, por isso, afeta diretamente a vida
de outras pessoas. Da mesma forma, a
moda faz crer que ainda existe algum
tipo de esperança e espaço para esse tipo
de debate. “Quando fiz a campanha da
Morana senti que as coisas estavam
dando certo. Represento outras trans
quando poso para as marcas. É gratifi-
cante ajudar outras pessoas iguais a
mim. Eu represento a minha classe. Tem
meninas, em rede social, que entram em
contato comigo para me parabenizar
dizendo que sou a inspiração delas”.
Não é raro que a infância e, sobretudo, a
adolescência de um transexual sejam
marcadas por discriminação ou algum
tipo de desrespeito, mas esse não é o
caso da modelo. “Eu tive sorte, mas
existem famílias que não aceitam. Se
um dia eu virar top e tiver mais
visibilidade, as famílias vão entender,
por meio da minha história, que é
preciso nos respeitar. Para lutar contra
o preconceito, o mais importante é o
amor e o respeito da família. Meu pai,
por exemplo, me deu o meu silicone. Ele
acreditou realmente na minha alma”,
finaliza.