My first Magazine Revista Sarau Subúrbio ed 02 | Page 39
M A R I A C A N D E L Á R I A
Maria Candelária não é alta. Nem funcionária. Nunca foi paraquedista. Mas já
caiu. Na vida, não na letra O.
Acorda, mas não almoça ao meio dia. Nem todo o dia.
A uma vai ao florista (só pra ver, da porta, a vitrine).
Às duas ao dentista – a quem aborda quando ele chega no elevador do
consultório que ela nunca frequentou.
Às três vai ao café – só pra descolar um qualquer.
Às quatro assina o ponto (no beco da cola) e dá no pé logo que vê a cana
dura chegar e cobrar o pedágio (que grande vigarista que ele é...)
Maria Candelária trabalha de fazer dó. Coitada da Maria, que nem conheceu o
General da Banda, irmão de cor, e vive preocupada com outras patentes menores.
Coitada da Maria, que tem medo de blecaute, pois cedo aprendeu que a falta de luz
é um terror na perigosa e comprida noite da Candelária.
O r l a n d o O l i v e i r a
(extraído de seu livro Linguagem dos morros e outros
contos, publicado em 2004, nos 30 anos da morte de
Blecaute, o General da Banda, e nos 20 anos da
chacina das crianças da Candelária)