My first Magazine A Luta Bebe Cerveja - Ana Sens | Page 28

27 Adélia Lopes veio de Aquidauana, interior do Mato Grosso do Sul, ser jornalista em Curitiba. Pisou na cidade dos pinhais no dia em que foi proclamado o Ato Institucional n.º 5 - 13 de dezembro de 1968. Achava a cidade feia. Fazia teatro com Denise Stoklos, Jornalismo na Universidade Federal e Sociologia na então Faculdade Católica. No dia do AI-5, Jaques Brand, outro jornalista, se lembra de estar tomando umas no bar. Era o Bar do Leleco, que ficava na frente da Casa da Estudante, ao lado da Reitoria, intensamente frequentado por estudantes. Para eles, a coisa toda acontecia no Bar do Leleco (ou Bar do Quim. É que Quim era o dono e Leleco, o garçom), na cantina da Reitoria (que servia pizza nos intervalos!) ou no Restaurante Universitário. Quem estudou na Federal em 1968 se lembra de ter reuniões dentro do RU para organizar a ocupação da Reitoria, um dos movimentos de resistência democrática ocorridos em Curitiba contra o regime militar. Nada melhor do que pensar quem é que vai derrubar o busto do reitor comendo um prato de arroz com feijão. Além disso, não era seguro conversar sobre essas coisas na frente de todo mundo. Na sala de aula, por exemplo, vira e mexe aparecia um informante, um araponga. Eles entravam lá e ficavam de tocaia, às vezes disfarçados de alunos, só para descobrir se havia algum subversivo na área. As pessoas tinham muito cuidado com o que falavam em voz alta, porque se fossem pegos pelos milicos, podiam não voltar. E como saber em quem confiar? A ideia de perseguição ideológica era real: o medo de falar mal do governo, o medo de ser capturado, o medo de ser ouvido por quem não deve. Tudo estava lá. As pessoas simplesmente desapareciam, não voltavam, ninguém ficava sabendo o que houve. No fundo, lá no fundo, sabiam sim, mas era difícil de acreditar. O AI-5, mais severa das medidas arbitrárias tomadas durante o regime militar, retirava direitos civis e políticos dos cidadãos e legalizava, por exemplo, a tortura. Foi assim até 1979, com a Lei da Anistia.