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MOÇAMBIQUE

sentir a tragédia pelos olhos de quem a vive .

Pemba , Fátima Falua e Nampula , João Silva

Asituação no norte de Moçambique é trágica . Depois de dois ciclones , que atingiram o país em 2019 e desalojaram centenas de milhares de pessoas , para além das centenas de mortes confirmadas , o ano de 2020 é agora marcado pela intensificação dos ataques armados em Cabo Delgado . Estes ataques , levados a cabo por grupos classificados como terroristas , começaram em outubro de 2017 e já provocaram mais de 1000 mortes e cerca de 430 mil deslocados internos , pessoas que tiveram que fugir das suas aldeias a meio da noite , enquanto estas eram incendiadas e destruídas . A situação está pior a cada dia que passa e pouco ou nada se tem conseguido fazer para pôr fim , ou sequer abrandar , o terror de que Cabo Delgado é palco . Para além disto , é angustiante verificar que cerca de metade dos deslocados internos são crianças e os restantes maioritariamente mulheres . Esta foi uma realidade difícil de enfrentar no terreno . Foram muitas as histórias de dor e sofrimento partilhadas com a equipa da Helpo , durante as atividades direcionadas para os deslocados internos . São histórias dolorosas de recordar e , mais ainda , de descrever . Histórias , que não deveriam ser contadas , porque não deveriam ser vividas . Em todas elas estão presentes a morte e o medo . Quase todas são de pessoas que acordaram durante a noite com a sua casa a ser queimada e ao som de disparos . Aqueles que conseguiam escapar à execução pelos insurgentes , escondiam-se no mato durante vários dias ou semanas , muitos sem comida e a beber apenas água dos rios e lagos . A fuga marcada pelos corpos sem vida , que se encontram no caminho . Estes são , na sua maioria , corpos de homens adultos , que ficam para trás durante os ataques na esperança de ganhar tempo para as crianças e mulheres fugirem . Muitas mulheres fugiram grávidas e deram à luz no mato , com pouca ou nenhuma ajuda ; outras fugiam com 2 e 3 filhos ao colo , em atos de desespero para sobreviver mais um dia . A mesma capulana , que usavam durante o dia , servia também de cobertor à noite ; e as capulanas são praticamente a única coisa que res-