ALINE CARDOSO DE OLIVEIRA – TRANSE
O que há lá em frente? Essa nuvem, além de mais escura que o normal, movese em uma velocidade muito alta. Por que ela está cada vez mais perto?
Estava imóvel, apenas com o foco de meu olhar alterando-se conforme aquilo
se aproximava.
Quando a nuvem chegou mais perto ainda, consegui perceber que não era
exatamente uma nuvem. Pássaros pretos, fazendo estardalhaços com suas gargantas
estavam a voar desesperados, pareciam voar em minha direção. Nossa, não apenas
pareciam.
Permaneci imóvel, de que adiantaria correr? Fiquei ali admirando a euforia do
bando ao entrar em mim. Com os primeiros tive um sentimento absurdamente
estranho, depois destes tantos comecei a me acostumar. Estes iniciantes me
empurraram para trás com uma certa força, minha sorte era que já estava tão
envolvida no grande manto preto daquelas aves que nem senti meu corpo tocar o
chão, mas sei que estava deitada nele. A pressão deles entrando em mim era incrível,
ia além da percepção física. Quem os olhava e olhava minha boca nunca iria imaginar
que ali passariam com tanta facilidade.
Sorte que ninguém olhava, sorte que não havia ninguém.
A sensação era incrível, tão boa que nem cheguei a pensar no momento em
que aquilo ocorria. Não havia concluído se era algo benéfico ou não até a hora em
que a experiência teve seu fim.
Algum tempo havia passado, não fazia noção do quanto. Mas quando saí
daquele transe, se é que posso usar essa palavra para definir, queria voltar.
Infelizmente todos os pássaros já estavam em mim.
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