GUILHERME SOHNLEIN EXEL – 100 ANOS DE SÁBADO
Sábado havia sido um bom dia. Daniel não estava com sono nem com frio, mas
rolava sorridente em sua cama, pensativo. De manhã havia saído para caminhar com seu
vizinho e os dois se tornaram amigos rapidamente. No final da tarde, foi com seus
colegas de trabalho no bar e os apresentou seu novo amigo. Voltou pra casa não muito
tarde e ainda conseguiu arranjar forças para ir à academia. Nada muito excepcional ou
incrível havia acontecido naquele dia, mas Daniel se sentia confiante e capaz de
qualquer coisa. Demorou para que ele conseguisse pegar no sono, mas ele não se
importou. Nada podia o abalar.
Ele acordou suado, como em todo dia de verão. Em dias de semana, isso era muito
desconfortável, já que ele não tinha tempo de tomar banho de manhã. Feliz porque era
domingo, ele pegou suas roupas e foi para o chuveiro. Ao sair, se sentindo bem acordado
e ainda confiante por causa do dia anterior, ele percebeu: não era domingo. Era sábado.
Ainda era sábado. Aquilo não podia estar certo, ele tinha bastante certeza de que ontem
havia sido sábado. Correu para a televisão e sintonizou no canal de notícias.
— Não existem registros de algo como isso ter acontecido no passado, mas não se
preocupe, a órbita da terra não foi abalada. — Disse uma mulher com aparência de
pesquisadora.
— Mas isso não pode desregular as estações ou algo assim? — Inquiriu o entrevistador.
— É muito cedo para dizer, mas tenho certeza que há uma simples explicação científica
para o ocorrido, nós só precisamos de mais dados antes de tirar conclusões precipitadas.
— Bem, acho que só resta esperar e ver o que acontece. Afinal, que mal pode fazer
apenas mais um dia de folga na semana, não é?
A entrevistada riu forçadamente, afinal nem ela nem o entrevistador estavam de
folga. Daniel passou por outros canais, mas eles pareciam ou não se importar, ou não
davam qualquer informação nova. Ele decidiu então tomar a mesma posição que o
jornalista e aceitar que um sábado havia sido adicionado à sua semana.
Enquanto preparava panquecas para seu café da manhã, a campainha tocou. Era
seu vizinho.
— Oi, como vai? — perguntou Daniel, ao abrir a porta.
— Com um sábado a mais, é como vai. Você viu que hoje é sábado?
— Sim, estava passando no jornal. Temos mais um dia de folga na semana.
— Isso é horrível. Eu tinha uma consulta no ortopedista marcada pra segunda-feira e
agora vou ter que ficar mais um dia com as costas desse jeito. Isto é, se amanhã também
não for sábado de novo.
— Bem, não há como saber. Afinal, se aconteceu uma vez, pode muito bem acontecer de
novo.
Os dois tomaram café da manhã juntos. De tarde, Daniel assistiu séries no Netflix
por três horas. Decidiu parar e dar uma adiantada em seu relatório para quarta-feira, mas
acabou procrastinando e não fazendo trabalho algum. Foi dormir logo que escureceu.
No dia seguinte, ao acordar, percebeu que ainda era sábado. Não estava surpreso,
embora estivesse profundamente preocupado. Pegou seu celular e começou a ler as
notícias. A mídia havia esquecido completamente do vírus Ebola, do Estado Islâmico e a
23