Jornal do Clube de Engenharia 608 (Novembro de 2019) | Page 6
O PAÍS
Desastre no litoral: derramamento de
petróleo tem impactos incalculáveis
Há quase três meses o Brasil
convive com mais uma tragédia
ambiental sem precedentes — e
ainda não solucionada. Era 30
de agosto quando moradores
das praias de Pitimbu e Conde,
ambas na Paraíba, relataram
manchas e vestígios de petróleo
na areia e no mar. Foram os
primeiros registros das mais de 4
mil toneladas de petróleo cru que,
nas semanas seguintes, atingiram
todo o Nordeste e já chegaram ao
Rio de Janeiro, no município de
São João da Barra, Macaé e em
direção a Cabo Frio.
Dezenas de vídeos e fotos nas redes
sociais exibiram grupos de morado-
res voluntários retirando o óleo das
praias com as próprias mãos, colo-
cando em risco sua saúde diante da
falta de ações coordenadas do poder
público. O último relatório do Ins-
tituto Brasileiro do Meio Ambiente
e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) sobre o tema, divulgado em
20 de novembro, mostra a extensão
do problema: 72% dos municípios
do litoral nordestino já foram conta-
minados com manchas ou vestígios
do óleo. São 695 localidades, em 117
municípios localizados nos nove esta-
dos da região e também no Espírito
Santo. O real impacto nos ecossis-
temas e nas economias locais, como
turismo e pesca, são ainda incalculá-
veis, mas tendem a se agravar com a
aproximação da alta temporada.
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Origem desconhecida
Os questionamentos sobre
a demora para que um plano
emergencial fosse criado cresce-
ram à medida que mais aparições
de petróleo surgiam. Ao mesmo
tempo, a investigação sobre a
origem do óleo tomou outro rumo.
Coube à Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ), através do
Laboratório de Métodos Computa-
cionais em Engenharia (Lamce) da
COPPE, algumas das descobertas
mais importantes sobre a possível
área de derramamento no mar.
“Partindo dos pontos de óleo, nós
fizemos uma série de modelagens
reversas, em função das datas que
o óleo atingiu o litoral brasileiro e
hipóteses de horário, para chegar a
um número razoável de simulações e,
através de probabilidade, tentar iden-
tificar a provável área onde ocorreu
o derramamento”, afirma o coorde-
nador do Lamce, prof. Luiz Landau.
Análises da densidade e da forma
como o petróleo era transportado
pelo mar permitiram levantar hipó-
teses sobre a origem de sua extração
— essas informações estão, agora,
ajudando a Diretoria de Hidrografia
e Navegação da Marinha a identificar
os responsáveis. Os dados do Lamce
permitiram também estimar que o
petróleo foi derramado entre 350 e
600 quilômetros da costa de Sergipe,
Alagoas, Pernambuco e Paraíba.
Os esforços da UFRJ em auxiliar
na mitigação do problema foram,
segundo Landau, voluntários. O
Lamce já atuou no monitoramento
e identificação de falso positivo de
petróleo no mar entre 2002 e 2004,
na Bacia de Santos, e entre 2003 e
2013, no Golfo do México. Para o
pesquisador, atuar no monitoramen-
to é urgente. “Toda ocasião em que
ocorre uma situação de derramamen-
to, seja no Brasil ou em outros países,
o tema volta à tona, e fica muito clara
a necessidade de se ter um sistema
de monitoramento permanente, que
nunca foi implementado”, critica ele.
Até agora não se sabe, de fato, a ori-
gem do petróleo. A Marinha e a Polí-
cia Federal seguem diversas linhas de
investigação: em outubro, por exem-
plo, cogitou-se que o óleo teria vindo
de um navio grego, o Bouboulina,
mas as suspeitas não se confirmaram.
Pesquisadores do Laboratório de
Análise e Processamento de Satélites
(Lapis) da Universidade Federal de
Alagoas (Ufal) afirmaram à imprensa,
no dia 18 de novembro, que estão
rastreando outro navio suspeito que
está voltando da Ásia em direção à
Venezuela, provável país de origem
do petróleo cru.
Demora nas ações
Desde 2013 o Brasil tem um Plano
Nacional de Contingência (PNC),
estabelecido pela Lei nº 9.966 para
ser adotado em acidentes de maiores
proporções com óleo ou substâncias
nocivas ou perigosas no mar, sempre
que a ação individualizada não se
mostrar suficiente para a solução do
problema. Os primeiros pedidos para
o acionamento do PNC surgiram no
início de setembro, mas o Ministério
do Meio Ambiente só tomou posição
mais de um mês após o aparecimento
das primeiras manchas.
Outro registro relevante é que a
Marinha do Brasil é a única insti-
tuição com capacidade operacional
para atuar na escala do problema. No
entanto, segundo o prof. Rodrigo L.
Moura, biólogo, professor da UFRJ e
pesquisador do Laboratório de Siste-
mas Avançados de Gestão (SAGE/
COPPE), sua indicação como Coor-
denadora Operacional só aconteceu