Jornal do Clube de Engenharia 606 (Setembro de 2019) | Seite 7
setembro DE 2019
o país
rando-se uma solução, mas encontra
resistência do Paraguai. Em 2018, por
exemplo, o Brasil consumiu 84% e o
Paraguai, 15,6% da energia gerada.
No Brasil, Itaipu é responsável por
15% da energia produzida, enquanto
no Paraguai chega a 90%. Como o
Paraguai consome a maior parte de
sua energia na fatia excedente, paga
apenas 6 dólares por Megawatt-ho-
ra, vendendo a energia mais cara ao
Brasil por 43,80 dólares por MWh,
segundo o Valor Econômico.
Essa distorção incômoda, embora
comercialmente legal, não vai mu-
dar tão cedo, porque o consumo do
Paraguai é muito pequeno e a taxa de
crescimento é baixa. De acordo com
o embaixador do Brasil em Assunção,
Carlos Alberto Simas Magalhães, em
entrevista coletiva no final de 2018,
há simulações que apontam que o
Paraguai poderá alcançar demanda
suficiente para utilizar 100% da sua
fatia da energia produzida pela Usina
até 2050. “Não teremos, eventual-
mente, em algum momento, a energia
excedente de Itaipu, o que significa
que teremos que encontrar essa ener-
gia em algum outro lugar”, destacou
o embaixador. O planejamento da ex-
pansão do sistema brasileiro já leva em
consideração a diminuição da energia
disponibilizada pelo Paraguai.
Itaipu é uma empresa binacional e
sua energia pertence, meio a meio,
a cada país. Tem ocorrido por parte
de entes do Paraguai alguma explo-
ração política, a nação mais pobre
reclamando da mais rica. O Brasil
é acusado por alguns de exercer um
“imperialismo verde”. O problema
para nós é que precisamos da energia
de Itaipu pertencente ao Paraguai,
e este poderá barganhar ameaçando
vendê-la para outro país. A renego-
ciação do Anexo C precisa ser efetua-
da com muito cuidado. Pelo Tratado
em vigor, o excedente da energia
de Itaipu que não é consumida no
Paraguai deve ser vendido ao Brasil,
como consta do Estatuto do Tratado.
Isso deve ser mantido. Já o valor das
tarifas representa negociação mais
frágil, mas que teremos que realizar
com firmeza.
Não se pode concordar com a
revisão da exclusividade do Brasil,
exercida neste momento pela Ele-
trobras, na compra da totalidade da
energia não consumida pelo Para-
guai e de sua venda para terceiros
países. Isto porque a exclusividade
é objeto do artigo XIII do Anexo
A do Tratado, que corresponde ao
estatuto da Itaipu. O Anexo A não é
objeto de nova negociação, apenas o
conteúdo do Anexo C, que regula-
menta os aspectos comerciais, assim
como os direitos e deveres das Altas
Partes Contratantes no uso, compra
e venda energia.
A busca de soluções para a disputa e outros interesses
Itaipu é responsável por um terço
do PIB paraguaio, o que deixa sua
relevância evidente para nosso vizi-
nho. Decisões entre os dois países,
no entanto, não são fáceis de serem
alcançadas. No final de maio, um
acordo entre os ministérios das Re-
lações Exteriores dos países buscou
uma solução para a contratação a
menor pelo Paraguai e para instituir
uma evolução gradual do consumo
paraguaio dentro da energia garanti-
da produzida.
O resultado dessa movimentação
foi uma crise política no Paraguai,
resultando em diversas demissões.
Foi aventado, inclusive, o pedido de
impeachment do presidente Mario
Abdo Benítez. O futuro é incerto:
todos os signatários da ata forma-
lizada em 24 de maio, que daria
sustentação ao novo acordo, não
ocupam mais os cargos que ocupa-
vam quando da assinatura.
O assunto já é público no Paraguai
e, em julho, foi criada uma cam-
panha da sociedade civil: “Itaipu
patrimônio nosso”, que defende
a anulação do tratado de 1973,
assinado pelas ditaduras brasileira
e paraguaia, considerado por eles
“fruto de invasão brasileira do terri-
tório paraguaio”. O foco do debate
O foco do debate é o Anexo C do
documento, que estabeleceu regras
tarifárias diferentes das regras de
mercado. Essa característica não
pode ser modificada, já que Itaipu
é uma entidade binacional, com
regras estabelecidas através de
Tratado, e, portanto, indepen-
dente de regras de mercado, seja
ele brasileiro ou paraguaio.
é o Anexo C do tratado, que deve
ser revisto em 2023, e que trata da
comercialização da energia por parte
dos países. Até essa data, o acordo
definia um funcionamento fora das
regras do mercado, algo que não
pode ser modificado com a revisão
do Anexo C do Tratado. Não pode
ser modificado porque Itaipu é uma
entidade binacional, com regras
estabelecida no Tratado, e, portanto,
independente de regras de mercado,
sejam elas do mercado brasileiro ou
paraguaio.
Note-se que a obrigação de venda
ao outro país está estabelecida no
Tratado, por meio do seu estatuto, e
não é objeto do Anexo C. A venda
da sua parte da energia a outros
compradores é um pleito do Para-
guai, porém isso exige mudança do
Tratado, o que não está previsto para
acontecer em 2023.
O Paraguai, ou uma empresa para-
guaia, não pode, pelas disposições do
Tratado, comercializar diretamente
a energia de Itaipu no mercado
brasileiro. De qualquer forma, pelos
próximos dez anos, pelo menos, o
Paraguai só terá o mercado brasi-
leiro para vender indiretamente a
parte preponderante da sua geração
de Itaipu. Não se pode deixar de
considerar, também, que há signifi-
cativos riscos neste processo, relati-
vos à regulação, às regras comerciais,
cambiais etc.
Observe-se ainda que, recentemen-
te, foi noticiado pela imprensa que
o governo do Paraguai recebeu, de
uma empresa do Brasil, proposta
para comercialização no mercado
brasileiro da sua parcela da energia
de Itaipu. Atualmente isto não é
legal, uma vez que esta atribuição,
pelo Tratado, deve e vem sendo
exercida pela Eletrobras.
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