Jornal do Clube de Engenharia 606 (Setembro de 2019) | страница 6
o país
O momento crucial: ano de 2023
Hoje, para a fixação das tarifas há dois critérios básicos: (a) pelo custo,
quando não decorreriam apenas das dívidas ou excedentes, mas por
uma remuneração (da ordem de 10 a 12%) sobre o investimento con-
tabilizado; (b) pelo valor da energia no mercado. No entanto, cabe
considerar o que foi estabelecido no Anexo C e que levou em conta
a essência do custo, mas em formato diferente, em face de se tratar
de uma instalação binacional. De qualquer modo, caberia estabelecer
novos critérios ao se renegociar a revisão do documento.
Como após 2023 praticamente todo o investimento inicial estará
amortizado, em meio a forte crise financeira atual, o Brasil juntamente
com o Paraguai terão que fazer, em breve, uma ampla discussão sobre a
receita excedente de US$ 2,04 bilhões. No centro deste debate, a maior
usina do mundo em energia produzida: Itaipu Binacional. Em 2023, as
dívidas do financiamento de sua construção, que integra o valor de sua
energia hoje, serão finalmente zerados. A usina estará paga e a receita
líquida oriunda da tarifa renderá um excedente nada desprezível. Para
onde vão esses recursos?
Diga-se, de passagem, que as tarifas brasileiras para geração de energia
firme estão entre as menores do mundo. O que onera o valor pago
pelos consumidores são os tributos. Para os residenciais, que não po-
dem compensá-los, pois não vendem produtos, chegam a mais de 60%.
Assim, mesmo que se reduzissem as tarifas de Itaipu, o valor final para
os consumidores cairia pouco.
Não existe resposta fácil para a questão e o debate poderá seguir di-
ferentes caminhos, desde a decisão monocrática até a ampla discussão
com a sociedade sobre a destinação da nova receita. Muitos são os
espaços importantes para receber esse recurso: as Bacias Hidrográficas
precisam ser recuperadas, a redução nas tarifas energéticas é uma ban-
deira antiga da indústria, que se sente prejudicada pelos altos gastos
que comprometem a competitividade das empresas nacionais no mun-
do. Deve ser constituído um fundo soberano ou o montante vai ser
depositado no Tesouro Nacional? Há várias decisões a serem tomadas.
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A disputa comercial
Brasil x Paraguai
O fato é que 2023 será um ano chave
para Brasil e Paraguai no que diz
respeito à Usina que construíram
e operam em conjunto, e que é um
marco geopolítico que hoje estrutura
boa parte das relações entre os dois
países.
Itaipu tem suas bases em tratados
e acordos internacionais firmados
entre os dois países e representou a
resolução de desacordos fronteiriços
históricos naquela área. O controle
conjunto funciona, mas há pontos
ainda em debate que até lá devem
tomar força. Não só a empresa estará
paga, como o “Tratado para o Apro-
veitamento Hidroelétrico dos Recur-
sos Hídricos do Rio Paraná, Per-
tencentes em Condomínio aos Dois
Países”, conhecido como “Tratado
de Itaipu”, documento que tornou
possível a construção da binacional,
completará 50 anos, com a revisão de
um de seus anexos (o C), justamente
o que trata da comercialização da
energia da usina.
Um ponto que certamente será
levantado é assunto espinhoso para a
gestão pública dos setores energético
e de relações internacionais. Itaipu
tem hoje dois produtos distintos:
a energia garantida (aquela que é
vinculada à potência contratada) e a
energia entregue que supera a energia
garantida (energia não vinculada e
energia excedente a potência contra-
tada).
Sobre o primeiro incidem os custos de
operação e manutenção, os royalties
e, até 2023, o pagamento do finan-
ciamento da construção da Usina. Já
sobre o segundo incidem apenas os
custos dos royalties, ou seja, é uma
energia mais barata.
Segundo o Tratado, cada país tem
direito a metade da energia produzida
na Usina. O Paraguai contrata pouco
da potência da Itaipu e, portanto, faz
uso de pouco da energia garantida (a
mais cara). Para atender ao seu consu-
mo, usa a energia mais barata (energia
não vinculada e energia excedente),
independentemente da quantidade
dessa energia mais barata disponibi-
lizada pela Itaipu. Esta questão volta
à tona de tempos em tempos, procu-
Itaipu é responsável por um
terço do PIB paraguaio, o
que deixa sua relevância
evidente para nosso vizinho.
Decisões entre os dois países,
no entanto, não são fáceis de
serem alcançadas.