Jornal do Clube de Engenharia 597 (Dezembro 2018) | Page 4
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DEBATES
BRASIL: desenvolvimento, política externa
e mercado internacional
O Clube de Engenharia sediou, de agosto a
novembro, o “Ciclo de Palestras: Geopolítica,
Soberania, Economia e Desenvolvimento”,
com apresentações de professores do Instituto
de Economia da Universidade Federal do
Rio de janeiro (IE/UFRJ), organizadas pelo
Instituto e seu Programa de Pós-Graduação
em Economia Política Internacional (PEPI).
Os eventos aconteceram em parceria com o
Clube de Engenharia, o Conselho Regional
de Engenharia e Agronomia (CREA-RJ),
a Associação dos Engenheiros da Petrobras
(Aepet) e a Associação dos Funcionários do
BNDES (AFBNDES).
As últimas oito décadas do
desenvolvimentismo brasileiro
O professor Eduardo Bastian apresentou, no dia 9
de novembro, a palestra “A atualidade do desenvol-
vimentismo no caso brasileiro”. Traçando um his-
tórico dos últimos 80 anos, o professor expôs fatos
e teorias sobre o desenvolvimentismo, resultante de
uma confluência de três correntes: os nacionalistas,
que acreditavam em um projeto de Brasil; os pape-
listas, que promoviam o crescimento econômico in-
dependentemente de haver problemas com déficit
público; e os positivistas, defensores da intervenção
estatal para se atingir o progresso.
O Brasil passou por diversas fases de desenvolvi-
mentismo a partir dos anos 1930. Nos anos 2000,
duas novas correntes explicam o período: o Novo
Desenvolvimentismo, representado por Bresser-
-Pereira, que defendia um papel mais limitado do
Estado, com promoção de exportações como ca-
minho seguro para o crescimento; e o Social De-
senvolvimentismo, uma tentativa de sistematiza-
ção das práticas exercidas nas gestões do Partido
dos Trabalhadores, com estímulo a investimentos
públicos e empresas estatais, além de distribuição
de renda e política de expansão do crédito.
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Para Bastian, nenhum dos dois modelos é sufi-
ciente para lidar com alguns desafios da econo-
mia mundial, como a concentração e automação
industriais e a dimensão ambiental. “O desafio
neste mundo não é tanto desenvolver setores, mas
progredir para os elos mais nobres das cadeias
globais de valor”, afirmou. O professor apresentou
propostas para o desenvolvimento do país nos
próximos anos: política industrial ativa, com pro-
tagonismo do Estado; investimento em centros de
pesquisas e parques tecnológicos; substituição de
importações com maior valor adicionado; e uma
política macroeconômica não recessiva, que não
trave o desenvolvimento.
Política externa e geopolítica
mundial
“As evoluções da política externa brasileira e a
geopolítica mundial” foi o tema da professora
Cristina Pecequilo que, em 23 de novembro,
tratou dos dois ciclos básicos que o Brasil viveu
neste campo nos últimos 30 anos. O primeiro,
chamado de modelo de “baixo perfil” (presente
no pós-Guerra-Fria, de Collor a FHC), fez com
que o principal parceiro comercial do Brasil fosse
os EUA, focando no comércio norte-sul. Já no
modelo de “alto perfil” (presente a partir dos anos
2000), os EUA são parceiros, mas são fortalecidas
parcerias com outras nações da América do Sul,
África e Europa. São duas visões excludentes
entre si e que se alternaram no poder.
A política de alto perfil se estabelece em 2003,
prevalecendo até 2010. É quando se funda a
União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e a
política externa multilateral se fortalece, inclusive
com a criação do BRICS e do G20. Também é o
momento de ascensão da China. Existe, de certa
forma, um equilíbrio de poder, e os EUA não atu-
am fortemente.
De 2011 até os dias atuais há continuidade dessa
política, mas sem intensidade e com reaproxi-
mação da potência mundial, caracterizando um
período de baixo perfil. A professora expressou
preocupação: “O processo de multipolaridade e
desconcentração de poder continua. Se nós fi-
carmos fora dele, é escolha nossa”, afirmou. Para
ela, ao optar pela política de baixo perfil, o Brasil
mantém um modelo de desenvolvimento antiqua-
do, baseado em commodities. “Nós estamos dei-
xando de investir em ciência, tecnologia, inovação,
educação. Esse é um modelo que vem transitando
para cá desde 2011”, afirmou.
Desafios da economia brasileira no
mercado internacional
A busca por soluções à crise econômica brasileira
deve passar por uma contextualização da econo-
mia nacional em comparação com as transforma-
ções do mercado internacional. Essa é a opinião
do professor Fábio Perácio de Freitas, que no dia
30 de novembro apresentou a palestra “Mudança
estrutural na economia brasileira recente”.
Freitas afirmou que a China tem tido papel
central na conjuntura econômica principalmen-
te após a crise de 2008, quando seus produtos
manufaturados inundaram o comércio global. O
resultado foi uma queda no preço relativo dos
produtos, acirrando a concorrência global e im-
pulsionando mudanças na divisão internacional
do trabalho, inclusive como parte da chamada
Indústria 4.0.
O Brasil tem sentido fortemente o impacto chi-
nês. “A partir de 2008 tivemos a entrada da Chi-
na nos mercados latino-americanos, que são os
principais destinos das exportações de produtos
manufaturados do mercado brasileiro”, explica o
professor.
Essa constatação, segundo ele, serve para se com-
plexificar o debate a respeito de uma desindustria-
lização no Brasil. Isso porque a capacidade ino-
vativa dos setores industriais tornou-se um indi-
cador essencial para avaliar sua relevância frente à
economia e frente às novas tecnologias.