Jornal do Clube de Engenharia 583 (Outubro de 2017) | Page 5
OUTUBRO DE 2017
INDÚSTRIA
Fim de política estratégica para o desenvolvimento?
Em momento de profunda recessão econômica, atendendo a pressões de petroleiras estrangeiras, governo opta por derrubar a política de
conteúdo local na cadeia produtiva do petróleo, gerando mais desemprego e desequilíbrio na balança comercial brasileira
Uma das políticas instituídas para
alimentar o desenvolvimento de
toda a cadeia industrial ligada ao
setor do óleo e gás, o conteúdo local
sempre foi considerado estratégico
para a Petrobras, a Agência
Nacional do Petróleo (ANP) e para
governos anteriores. Através do
conteúdo local empresas brasileiras
não só tinham a demanda necessária
para crescer e desenvolver novas
tecnologias, como também não
disputavam em concorrência desleal,
sem proteções, com fornecedores
estrangeiros.
Se por um lado a ferramenta para
assegurar mais um papel para o
Pré-sal brasileiro, o de indutor
de desenvolvimento da indústria
nacional, sempre foi vista como
necessária para a consolidação de
uma indústria sustentável e voltada
para os interesses da nação, por
outro, a exigência de contratar o
Brasil não agradava às empresas
estrangeiras. Alegando ser a
exigência de conteúdo local um dos
entraves para a licitação dos campos
do Pré-sal, o governo Temer vem
reduzindo os índices exigidos às
concessionárias e flexibilizando o
seu uso a ponto de já não ser um
quesito relevante nas licitações.
Caminha, invariavelmente, a
passos largos para o seu total
desaparecimento.
Na contramão da história
No resto do mundo, o caminho é
inverso ao do governo brasileiro.
Na Arábia Saudita, o índice
de conteúdo local é de 70%. A
Inglaterra restringe a importação
e a China, além de restringir as
e Social (AFBNDES), que
compuseram a mesa.
Uma faceta do desmonte
Conteúdo local é estratégia para desenvolvimento da indústria nacional, afirmaram os presentes
importações, trabalha com barreiras
não tarifárias. Nos EUA, indústrias
estratégicas são priorizadas e as
compras governamentais induzem
o desenvolvimento. Não bastassem
os exemplos internacionais, um
estudo simples comparando o
que acontecia no setor quando os
leilões não foram tão bem sucedidos
quanto o esperado pode provar que o
Governo aponta um vilão sem bases:
o conteúdo local como obstáculo
para os leilões não é fato, e quem diz
isso é Renato Corona, representante
da Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo (Fiesp).
Segundo ele, os números mostram
que o que atrapalhou de fato os
leilões foi o momento em que foram
feitos. “Quando o preço do petróleo
era alto, havia exigência de alta
porcentagem de conteúdo local. Mais
tarde, em 2014, quando a produção
cai, acontece em momento de forte
queda no preço do barril do petróleo,
da Lava Jato e de consecutivas
revisões nos Planos de Negócios
da Petrobras, entre outros fatores”,
destacou o representante da Fiesp.
Para tratar do assunto com a
sociedade e escutar os atores
envolvidos, a Comissão de
Assuntos Econômicos (CAE)
do Senado Federal autorizou a
realização de audiência pública
no Clube de Engenharia, dia
22 de setembro. Requerido pelo
senador Lindbergh Farias (PT-
RJ), o seminário “Conteúdo
Local – Cadeia de Petróleo e Gás”
reuniu especialistas, acadêmicos,
sindicalistas e contou com
apresentações e intervenções
de Pedro Celestino, presidente
do Clube de Engenharia; Davi
Kufper, professor do Instituto de
Economia da UFRJ; Luís Miguel
Falcão, coordenador-geral da
Secretaria de Desenvolvimento
e Competitividade Industrial do
Ministério da Indústria, Comércio
Exterior e Serviços; José Veloso,
presidente da Associação Brasileira
da Indústria de Máquinas e
Equipamentos (Abimaq) e
Bruno Araújo, da Associação de
Funcionários do Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico
A gradual queda e descarte da
exigência do conteúdo local
acontece em momento crítico
para o setor e para o país. A
Petrobras, que vem sofrendo ataques
consecutivos com a venda de
ativos e dissolução daquele que por
décadas foi o mais importante grupo
empresarial do país e âncora de seu
desenvolvimento é, mais uma vez,
atingida. Na abertura da audiência,
após traçar percurso histórico
da Petrobras, Pedro Celestino
evidenciou o resultado direto das
novas políticas do governo. “Ao
longo de sua história, a Petrobras
criou uma cadeia produtiva de mais
de cinco mil empresas, empregando
centenas de milhares de
profissionais de todos os ramos (...)
Com a venda de nossas refinarias,
dependeremos da importação de
derivados e petroquímicos e é assim
que se destrói a economia do país.
O Clube defende