Jornal do Clube de Engenharia 580 (Julho de 2017) | Page 7

JULHO DE 2017
de incentivos públicos ”, destaca Medeiros .
No início da década de 2000 e por toda a década de 2010 , até recentemente , o foco do Estado voltou a ser o de incentivador do desenvolvimento . Políticas Industriais focadas nas indústrias com alto lastro tecnológico e longas cadeias de fornecedores , somados a grandes investimentos governamentais em infraestrutura e um objetivo claro de priorizar o conteúdo local fizeram reacender a indústria nacional . As compras de governo realizadas pelas grandes empresas estatais , conhecidas no mundo inteiro como indutoras de avanço de indústrias de bens de capital ( que costumam ter grande lastro tecnológico por meio de inovações incorporadas ao maquinário ), impulsionaram a economia do país . As políticas governamentais pós-impeachment reverteram esse quadro ao implementar um sistema de economia doméstica no país . Aos poucos , as grandes empresas , como a Petrobras , perdem seu papel de indutoras de desenvolvimento . Os investimentos públicos também secam e os centros de pesquisa morrem à míngua . Um dos maiores êxodos de pesquisadores tem início em todo o país . No ápice desse projeto , o congelamento dos gastos governamentais por duas décadas , que representa a completa asfixia do país .
Na transição da nova revolução industrial , as experiências vêm mostrando que o papel do governo é , mais que fundamental , de liderança . Nos Estados Unidos , o programa de reconversão da manufatura nasceu no gabinete do presidente Barack Obama . Era ele que convocava as reuniões

Na transição da nova revolução industrial , as experiências vêm mostrando que o papel do governo é , mais que fundamental , de liderança .

com presidentes de indústrias e de associações empresariais . Desde 2011 , uma secretaria de manufatura avançada reúne os ministérios da Energia , Defesa , a NASA , universidades e as empresas que tocam os projetos . Na Alemanha , a união de esforços envolve entidades de classe , fabricantes de máquinas e software , associações de empresas , academia e governo , através dos ministérios de Educação e Pesquisa e de Economia e Energia . Em ambos os casos , o objetivo é aumentar o surgimento de novas plantas industriais . A participação do Estado é óbvia : além de fomento financeiro e liderança , o investimento em inovação e educação pode fazer nascer o salto de desenvolvimento necessário antes que a indústria nacional perca a competitividade por ter ficado obsoleta .
Tecnologia esquecida
Após a crise de 2008 , a reestruturação produtiva vem se estabelecendo , em diversos pontos do mundo , com foco nas novas tecnologias , materiais e fontes de energia , tornando obsoletas as antigas formas de produção . Nesse
cenário , o Brasil larga atrás . Mas não foi sempre assim . A indústria de alta tecnologia já foi destaque no Brasil quando , com recursos públicos e investimentos estatais , um parque científico e tecnológico que superava aqueles dos demais países em desenvolvimento foi instalado no país . “ No fim dos anos 1970 , todos os grandes blocos da indústria moderna , inclusive o da informática , base da tecnologia da informação no mundo e setor-chave para a modernização industrial , estavam instalados no Brasil ”, lembra Carlos Aguiar de Medeiros .
A opção pelas importações e as joint-ventures , no início dos anos 1990 , foram responsáveis pela queda gradual da capacitação nacional no setor . A redução das verbas destinadas à pesquisa e desenvolvimento e as privatizações também colaboraram para levar o país de pioneiro a periférico . Os investimentos deram lugar a uma crescente dependência de tecnologia estrangeira .
Enquanto o mundo avança em direção à indústria 4.0 , considerada a quarta revolução industrial , o Brasil patina . A Internet das Coisas — um passo na direção da “ nova indústria ” — cresce no exterior . No Brasil , em maio de 2016 , ela estava presente em cerca de 53 % das companhias brasileiras , alcançando o mesmo patamar que países desenvolvidos como Estados Unidos , Rússia e China . Os dados foram apresentados na matéria “ Desenvolvimento nacional aposta na Internet das Coisas ”, no Portal do Clube de Engenharia ( bit . ly / apostaiot ). Com o contínuo desmonte e asfixia do desenvolvimento nacional , esse é mais um patamar que pode ser perdido . Outros países , no entanto , estão atentos ao timing que não
pode ser perdido . Na China , para alcançar a inovação , a capacitação tecnológica e uma infraestrutura moderna , capaz de viabilizar a difusão de novas tecnologias e maior articulação produtiva , a opção foi centrar os esforços na elevação da indústria a um outro patamar . “ Tal como sublinhado na estratégia chinesa para a indústria , explicitada no programa China Manufacturing , o desafio , sobretudo para os países que possuem um amplo mercado interno , é aumentar o esforço de atualização tecnológica de forma a reduzir o hiato tecnológico e evoluir de um sistema centrado na produção industrial com tecnologias importadas e baixo valor agregado para outro baseado em inovações com tecnologias próprias e maiores encadeamentos nas relações industriais ”, explicou Medeiros à Carta Capital . Na matéria “ A importância mundial das startups e o cenário brasileiro ”, no Portal do Clube de Engenharia ( bit . ly / cenariostartups ), Márcio Girão , presidente da Federação Nacional das Empresas de Informática ( Fenainfo ), conselheiro do Clube de Engenharia e ex-presidente ( 2003 / 2004 ) da Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro ( Softex ), destaca o atraso do país em relação ao restante do mundo no que diz respeito à tecnologia : “ O Brasil está atrasado . O mundo já pensa na quarta revolução tecnológica e nós talvez estejamos na segunda . O Brasil precisa repensar esse processo e fazer um projeto de Estado junto às empresas , universidades e sociedade no sentido da supervalorização dos projetos startups ”, afirma . Os rumos que o governo vem tomando , no entanto , são inversos aos propostos por Girão e preocupam , cada vez mais , os técnicos e especialistas .

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