Jornal do Clube de Engenharia 578 (Maio de 2017)) | Page 3

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MAIO DE 2017
ECONOMIA

A dívida pública e a mentira do déficit da Previdência

Governo oculta relação entre aumento da dívida e reforma que retira direitos , diz pesquisadora
É o modelo econômico , concentrador de renda e riqueza , que separa a realidade de abundância do Brasil do atual cenário de escassez . É o que diz a fundadora do movimento Auditoria Cidadã da Dívida , Maria Lúcia Fattorelli , ex-presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal . Em palestra no Clube de Engenharia no dia 7 de abril , a auditora fiscal aposentada criticou incoerências da gestão pública que privilegia o pagamento da dívida em detrimento dos investimentos sociais .
Em 2016 o governo federal destinou a maior parte do seu orçamento , 43,94 %, para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública . Ela é criada quando os gastos são maiores que as receitas , fazendo com que a União tenha de emprestar dinheiro a partir de “ títulos da dívida ”, vendidos no mercado de capitais com garantia de pagamento e juros . Enquanto isso , a Previdência Social , alvo de ataques no Congresso Nacional , recebeu 22,54 % dos recursos em 2016 ( veja o gráfico ). Comparada com outros gastos , como Transporte ( 0,39 %), Saneamento ( 0,02 %) e Ciência e Tecnologia ( 0,24 %), o destaque dado à dívida pública se mostra ainda maior .
“ O endividamento público tem funcionado às avessas . Em vez de servir para aportar recursos para o Estado , tem provocado uma contínua e crescente subtração de recursos públicos , direcionados principalmente ao setor financeiro privado ”, afirma Fattorelli . O movimento que ela lidera pede uma auditoria para verificar possíveis ilegalidades na dívida pública , como juros e condições abusivas e transformação de dívidas privadas em públicas . Em março de 2017 , segundo o Banco Central , a dívida bruta do setor público chegava a R $ 4,5 trilhões , 71,6 % do PIB , com histórico ascendente .
Discurso da Escassez
“ Novos mecanismos financeiros que geram dívida pública surgem a todo momento . Por trás da máscara de ‘ controle de gastos ’, propagandeada durante a tramitação da PEC 55 no Senado ( que congelou investimentos por 20 anos ), está o privilégio dos gastos com a dívida ”, critica Fattorelli . Para a pesquisadora , a reforma da
Previdência ( PEC 287 / 2016 ), em trâmite no Congresso , também evidencia esse privilégio .
“ O principal argumento do governo é o déficit , o que não é verdade . A lista de devedores da Previdência supera R $ 400 bilhões . O governo fabrica o déficit fazendo uma conta distorcida , que considera apenas a arrecadação do INSS e compara com todo o gasto da Previdência ”, afirma .
Para a pesquisadora , a reforma da Previdência privilegia o mercado financeiro , cujo volume de negócios seria ampliado com a oferta de planos de previdência privada e fundos de pensão de natureza aberta . Vale lembrar que , de acordo com dados do Banco Central de outubro de 2016 , os principais credores da dívida pública são grandes fundos de previdência ( 24,6 %) e de investimento ( 22,1 %) e instituições financeiras ( 23,1 %).
“ Por isso nossa bandeira é a auditoria , única ferramenta capaz de provar o que estamos dizendo . O Brasil tem que abrir os olhos e acordar para os mecanismos utilizados para gerar a dívida pública e suas consequências . Na prática , não estamos tratando só do desmonte da previdência social e sim da condenação de um país jovem a não ter futuro ”, concluiu Fattorelli .
Leia mais : bit . ly / auditoriadivida
Orçamento Geral da União 2016 Executado ( pago ) Total = R $ 2,572 Trilhões
Outros
Outros encargos especiais
3,74 %
Desporto e lazer
0,02 %
Transporte
0,39 %
Agricultura
0,77 %
Habitação
0,00 %
Cultura
0,04 %
Urbanismo
0,06 %
Saneamento
0,02 %
Gestão Ambiental
0,13 %
Ciência e Tecnologia
0,24 %
Direitos da Cidadania
0,07 %
Legislativa
0,27 %
Judiciária
1,21 %
Essencial à Justiça
0,25 %
Administração
0,88 %
Defesa Nacional
2,23 %
Segurança Pública
0,33 %
Relações Exteriores
0,11 %
Organização Agrária
0,09 %
Comércio e Serviços
0,09 %
Indústria
0,08 %
Comunicações
0,05 %
Energia
0,07 %
Fonte : SIAFI - http :// www . camara . gov . br / internet / orcamento / bd / exe2016mbd . EXE

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