Gilberto Candido
BISCATEIROS
Ao ermo das capoeiras de uma pequena cidade no
Sul de Minas, morava um guru ermitão, que com suas simples e
sábias palavras dizia: “Todo homem tem que nascer biscateiro”.
Quase meio século depois, decifro as palavras do
folclórico eremita e concordo plenamente com ele. Desde a
época, eu subentendia haver um bocado de machismo naquela
frase. Mas, pelo contrário, o que entendo hoje é que o velho
tinha era um feminismo extraordinário. Por isso é que as
mulheres gostavam e jamais alguma delas preocupou-se em
questioná-lo. Veja bem: o homem que nasce com o dom de ser
biscateiro, geralmente faz carreira, gradua para camelô, para
representante, até vestir a beca do empresariado. Nesse
percurso, vai despertando-lhe, gradativamente, a curiosidade
para as exigências femininas. São as mulheres quem vão
acompanhando, criando e ditando as atualidades fashions. São
elas que mais se vestem, vestindo os filhos e o marido. São elas
que mais se empetecam como nenhum outro ser é capaz. São
elas que receitam e nutrem a família com o prato de cada dia.
São elas que dão as maiores e melhores dicas na aquisição do
carro, na escolha do local paradisíaco das férias e nas reservas
do hotel, quer o homem entender assim ou não. Todas as
decisões mais cotidianas estão nas mãos da mulher.
O homem que nasce e morre sem biscates é incapaz de
focar a mulher por essa ótica regular. Não repara o novo
penteado feminino. Não repara o batom nem o rouge. Não
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