Inominável Nº 1 | Page 9

Nº 1 - Dezembro, 2015

comoveu e me relembrou que a emigração já foi uma dor maior, e como somos agora abençoados: “I leaned over the railing and watched the ropes which held us to the dock. When they slipped into the water my heart sank with them – Mavis Appleyard”.

Ao fim de exactamente um mês surgiu a oportunidade de rumar a sul. Assim, no dia da Mãe fiz-me à estrada de malas feitas com o meu filho, numa viagem de expresso que durou oito horas, apresentando-nos paisagens maravilhosas, e que nos levou a novo destino: Taunton, capital do distrito de Somerset, no Southwest, onde encontrei a Inglaterra do Rei Artur com que sonhava em pequena, e foi aqui que as peças do puzzle se encaixaram. Tudo se tornou mais fácil (até o inglês aqui se compreende melhor!) e em pouco tempo estabeleci-me na minha casa e no trabalho, e o meu filho frequenta finalmente uma escola que vai de encontro às suas necessidades. Chamem-lhe destino, chamem-lhe o que quiserem, talvez nada seja por acaso... mas aqui encontro tudo o que procurava nos meus sonhos de infância!

O countryside é maravilhoso, e existe um equilíbrio perfeito entre natureza e progresso, entre a tradição e o moderno. Estamos perto da costa jurássica, e à distância de uma viagem de autocarro podemos cheirar o ar salgado da beira-mar e ouvir a música incomparável das ondas a saudarem a praia.

Os campos são a perder de vista e o verde é mais verde. Os animais do campo vivem com a qualidade a que têm direito e, como eu costumo dizer, aqui nem os gatos têm medo das pessoas, vindo ter connosco na rua e aceitando festas como se de cães se tratassem. As ruas são limpas e não se vêem animais abandonados. Fervilha a actividade, as lojas são muitas e de todo o género, as ruas são floridas e os parques, com os seus esquilos, são mais que muitos… e quando menos se espera ouve-se música ao vivo numa esquina: pode ser um homem e uma harpa, como pode ser uma banda inteira a montar um espectáculo! Arte e actividades outdoor são muito apreciadas, talvez mais do que em países com mais sol. Feiras de artesanato e de todo o género, campanhas de solidariedade para as mais variadas causas, são algo comum pelas ruas que percorremos todos os dias. Não existem prédios imensos aqui, e todas as fachadas são mantidas na forma original: castelos que são agora hotéis, pubs, restaurantes, cafés, tudo mantém o charme e a característica britânicas, não faltando as charmosas casas de chá, com os seus bules em mesas atoalhadas e mobiliário rústico, e a livraria Waterstone’s com os seus lustres em tectos altos e as janelas vitorianas que nos fazem sentir num outro mundo, onde folheamos o nosso imaginário...

Tenho muito mais para contar sobre esta experiência de viver literalmente na ilha, que por vezes parece um mundo à parte do real mas que tem também os seus quês menos charmosos. Um deles o frio, que já o sinto como uma ameaça silenciosa. Se sobreviver a ele (sim, sou demasiado sensível ao frio, o que é pouco conveniente aqui!), falarei da gastronomia, da tradição da cidra e das noites animadas por esta bebida e muitas outras, of course!, da ida que está programada a Glastonbury e ao seu Thor, vila mítica onde dizem que repousam os restos mortais do Rei Artur, das igrejas espantosas na sua arquitectura e energia positiva, das personagens excêntricas de carne e osso que encontramos por aqui (como o homem quase despido que passa os dias a dançar na esquina, ou o poeta que dizem ser louco, e que sobe uma rua íngreme de costas)... temas não faltam, nem a inspiração à minha volta!

See ya!

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