Inominável Inominável #15 | Page 96

O rio de João Cabral é um corpo mutilado,

discurso de canal engordado sob gondola;

cabeça-nascentes do pensamento truncado,

é mão amputada dos dedos longos distante.

Salta em caldo engorda corpo represado.

Ou emagrece, se afina no curso seu tom;

uma silhueta na passarela disforme torta

consumida na pena serelepe dos homens.

Mas o mesmo rio grita sua fome de mello

de anas, de roseanas, de helenas e barones

de tantos outros que se encontram no rio

em meio curso do fio discurso e potável.

Na corredeira alarga as margens verdes

poesia ripária ou ripícola de mata ciliar

quando rompe os diques da leitura fácil

se abre caminho fluência do estagnado.

Oxumaré desfaz-se arco-íris na chuva

pra Logunedé pescar palavra e homens.

João Cabral, Exu de faca e pedra lâmina

de canavial, no estio abriu o rio pro mar.

Ora vejam no desenho da arquitetura,

ouçam no batuque dessa franca língua

árida: Oxum se ri de ser musa do amor

doura ser da riqueza prima meia-irmã.

Volta o rio à nascente auto falante,

Iemanjá limpa o mar, a foz fertiliza.

A mãe de muitos orixás é lugar de fala,

e dona da fertilidade 'doabre' caminhos.

Tanto mar...

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Doabre (*)

Brasil

baltazar

Inominável

(*) ou, batuque inominável de franca língua árida,

um diálogo com o poema " Rios sem discurso " do poeta João Cabral de Melo Neto

e uma homenagens aos orixás da mitologia iorubá