Inominável Inominável #13 | Page 82

Vocês já ouviram a história do lenhador e sua mulher pobre?

Viviam felizes na sua miséria, no campo, mas sem filhos.

O silêncio nas horas claras comia suas palavras, sua alegria.

Desejavam o campo fértil mas colhiam apenas pedras mudas.

Um dia encontraram à margem do lago

uma criança bem pequena abandonada.

Chorava de fome, era linda, uma menina

tão pequena, desamparada ali deixada.

A mulher e o lenhador se encantaram,

para longe da margem do lago a levaram.

Cuidaram, alimentaram, vestiram seu corpo

com a mesma pobreza que dividiam

para vê-la crescer em formosura

até que um dia...

A criança tornou-se essa jovem linda

e no meio de um mistério disse que faria

para a miséria do casal um belo vestido.

Como assim?

Costurar nada em nada não daria

ao corpo o que cobrir

além de um véu de nuvem para o rosto.

O lenhador e sua mulher ouviram

da filha crescida a estranha condição:

Vocês não podem ver o acontecer,

devo costurar longe dos seus olhos

e por nenhuma razão vejam como faço

o que faço - cabisbaixa ela lhes dizia.

Assim os pais aceitaram sem acreditar

que no dia seguinte ao estranho acordo

veriam a casa cheia de roupas novas

e, para maior surpresa, feitas de ouro.

Assim se deu, conforme se contou.

A moça escondeu-se, teceu,

cortou e costurou

impressionantes vestimentas.

A alegria não podia ter fim.

Estamos ricos! dizia o lenhador à sua pobre mulher.

Nossa filha tece fios de ouro

e faz roupas tão lindas que poderiam ser vendidas

além do lago, na outra margem muitos nos veriam,

seríamos admirados, temos ouro mas nada de fartura.

Trocaremos algumas peças por comida,

outras por uma casa 'bem mais maior',

então teremos a filha, as roupas

e tudo que os outros não têm.

Até ali pensavam satisfeitos nunca observar

de onde vinham os fios da magia.

Mas, como tudo que abastece parece

pedir razão que sustente o medo de não durar,

o casal decidiu espiar a jovem escondida

esquecida em si mesma

a tecer o nada ao nada

criando o que em nenhum lugar havia.

Assim olharam o que não deviam

esquecidos do acordo feito um dia.

No mesmo instante que viram

no puro silêncio a jovem que tecia

tudo se desfez

com a mesma voracidade

com que a fome os comia.

Tanto mar...

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A história do lenhador e sua mulher pobre

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