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Inominável

Escrevo entretanto esta coluna aos poucos, ao ritmo dos lugares que começo a conhecer. Assim, eis mais um momento em que escrevo para vocês, passados três dias do último contacto muito próximo com o mar; estamos numa praia maravilhosa chamada “Lombo Gordo”. Tivemos de descer bastante, deslumbrando-nos com um caminho rico em natureza bruta, como é habitual por aqui. A areia que se entrelaça nos dedos dos pés é preta, e quando as ondas a vêm beijar dezenas de pedras, pretas também, fazem um som quase de tambor, enquanto rolam para cá e para lá ao sabor das vagas de espuma. No pontão ao fundo dois pescadores praticam pesca à linha enquanto eu aguardo que o meu futuro jantar seja caçado com arma e barbatanas nos pés. Um cão preto, da raça Labrador, escala as rochas como se de uma cabra de montanha se tratasse, e delicia-se cá em baixo com as ondas, rebolando na areia... e eu juro que quase consigo ouvir-lhe uma gargalhada! A comunhão com a natureza é, de facto, sentida por todos sem excepção.

Assim, entre o frenesim de ajeitar o ninho – como eu gosto de dizer – de ir dando notícias aos familiares e de ir tratando de burocracias, chegou o dia em que senti ser de férias novamente, sem pensar em mais nada a não ser usufruir o momento. Conheci, naturalmente, o sítio mais turístico da zona e da ilha: as furnas! As caldeiras do vulcão, o seu cheiro a enxofre que a muitas pessoas ameaça com o vómito (mas que a mim não me incomodou), a vista de fazer perder a respiração, o milho cozido na caldeira que fez a delícia do meu filho, a lagoa mágica cheia de vida, dentro e fora de água, onde podemos ver patos e gatos, estes

de barco uns dias antes, pusemo-nos a caminho de uma casa que eu não fazia ideia de como era. Mas também não era coisa que me preocupasse demasiado! E então descobri que não criar expectativas para além do básico pode trazer-nos surpresas maravilhosas - qual bónus do universo por não nos prendermos a coisas fúteis - como por exemplo uma casa espaçosa e a tal cozinha rústica com que sonhava. Sonhava mas não esperava... muito menos a poucos passos de uma linda vista para o mar! Esta é uma bênção nos dias de hoje, e vou tentar ter isso sempre em mente – porque acabamos por banalizar as bênçãos que temos – mesmo até nos dias menos inspirados. Assim, sem sobressaltos, e finalmente sem stress ou correrias, instalámo-nos na ilha...