Inominável - Ano 2 Inominável Nº9 | Page 49

Nº 9 - Agosto 2017

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Que futuro se reserva aos meus três filhos? Que lhes posso deixar? Que tormentas, anseios, amores e medos terão neste mundo inescrutável como sempre foi o mundo? E a confiança que julgo ter nos seus juízos futuros, não será o último refúgio do pavor do incerto, da certeza que tenho da inesgotável aleatoriedade das suas vidas?O controlo que julgamos ter sobre os filhos esfuma-se habilmente, como um gás inebriante que à medida do cansaço dos anos se entranha, até aos últimos dias da indiferença e do egoísmo que as mortes provocam. Resta-nos então a utopia de Londres, a cidade mais importante da “Pista um”, um bigbrother moralista, maciço e opressor, que evita os acidentes, reescreve o passado e programa os passos seguintes. Eis aqui o mundo perfeito dos pais; um mundo asséptico, indolor, livre de imprevistos. Onde o traje, o corte de cabelo, o trajecto para a escola, a quantidadede cenouras do almoço, as pausas, o culto, sejam uniformes e previsíveis. Até onde umas simples costas possam ser reveladoras. Todo o perigo reside então no livre pensamento, nas emoções e na ternura, na arte, na literatura não oficial, como os manuais das utopias sabiamente antecipam. Onde as ofensas à autoridade dos pais, dos professores, dos sábios, sejam inexoravelmente interditas e, em casos extremos, severamente punidas.

Foi desta Londres, de George Orwell, no livro 1984, que me lembrei há dias, no meio do caos de choros, fraldas, banhos, comida e roupa espalhadas.

Desejei, em pânico e no meio da confusão, essa sociedade utópica. Onde o tudo fosse programado e controlado e qualquer aleatoriedade devidamente suprimida. O mundo perfeito das BigMothers.

Foi um pensamento tão egoísta quanto breve; esta BigMother que vos escreve quer manter as suas crias protegidas, mas quer, sem receitas ou moralismos, ajudar a descobrir as ferramentas necessárias para que as nossas crianças possam ter livre pensamento, demonstrem emoções e ternura e conheçam artes e literatura não oficiais.

Sou mãe de três crias (neste caso, três “crios”), um na pré-adolescência e dois com um ano e meio. A distância de idades que os separa é grande, pelo que tive de me reprogramar. Outro factor de bastante relevância é o facto de os mais pequenotes serem gémeos! Foi necessária a actualização de uma versão v.1.0 para uma versão v.3.0 a uma velocidade que eu pensaria não ser capaz.

Há alturas em que continuo a pensar não ser...

Contarei nesta coluna como é ser mãe destas três crias, com todas as exigências, tormentos, alegrias e assoberbamentos que esta situação acarreta. Esperemos que gostem e que de alguma forma vos seja útil.

Até breve!