“Meu maior medo é que a gente perca a capacidade de se indignar com as injustiças”.
Segundo Dellagnol, muitas vezes queremos um país melhor, mas esperamos heróis e ficamos como vítimas do passado. “Culpamos os portugueses, mas eles já saíram daqui há 200 anos. Nós precisamos fazer mudanças de baixo pra cima. Precisamos ser autores da nossa história”, convoca. Segundo o procurador da República, o golpe mortal da corrupção é um “veneno paralisante” chamado cinismo. As pessoas passam a ter uma descrença de que o país não tem mais jeito. E com isso, não se faz nada para mudar. “As classes mais abastadas pagam a conta da corrupção com o dinheiro do próprio bolso. Você paga essa conta quando paga uma escola particular, um plano de saúde, por exemplo. Já a classe mais simples, paga a conta da corrupção com a vida”, reclama.
Segundo levantamentos da ONU, a corrupção desvia anualmente 200 bilhões de reais no Brasil. Isso significa 10% da arrecadação tributária do país. “É tanto zero que a gente tem dificuldade de imaginar o que fazer com tanto dinheiro”, ironizou Deltan Dallagnol, coordenador da Força Tarefa da Lava Jato no I Encontro Mineiro do Mercado de Recebíveis, realizado pelo SINDISFAC MG em Agosto deste ano. Com esse dinheiro, seria possível triplicar o investimento em saúde e em educação e aumentar em cinco vezes a segurança pública. “A corrupção gera um problema para a democracia. Porque quem está no governo não decide para o povo, mas para ele próprio”, criticou.
No entanto, sabe-se que os políticos nascem do povo, de uma cultura que está doente. Segundo pesquisa da Consultoria ICTS, realizada com nove mil pessoas, 61% dos entrevistados confessaram que em algumas situações aceitariam adotar medidas antiéticas ou ilícitas e 52% das pessoas disseram que aceitariam receber suborno em determinadas circunstâncias. Essa mesma pesquisa é contraposta por um levantamento do IBOPE (2014) que constatou que a maioria do eleitorado brasileiro se considera honesto, mesmo cometendo pequenos atos de transgressão no dia a dia e repudia os atos ilícitos dos governantes.
NÓS PODEMOS MUDAR O BRASIL
E será que a Lava-Jato pode ser uma mudança de página? Segundo Dellagnol, infelizmente não. O procurador acredita que essa é apenas uma oportunidade de transformação e de recuperação do dinheiro desviado. Assim como foi o “mensalão”. No entanto, o país inteiro vive um apagão ético. “O que estamos fazendo é o tratamento de um tumor. Mas o sistema é cancerígeno. Enquanto estamos tratando esse tumor, outros estão surgindo em paralelo”.