Hatari! Revista de Cinema #05 Ficção Científica | Page 41

Tom Cruise, logo que terminou de assistir ao filme espanhol Abre Los Ojos (1997), de Alejandro Amenábar, comprou os direitos de remake e iniciou a produção de Vanilla Sky (2001). Junto ao diretor Cameron Crowe, ele não se preocupou em contar a mesma história, apenas com um ponto de vista diferente. Vejo, na versão original, uma história mais pura e enigmática, na qual o foco está nos acontecimentos e não nos per- sonagens, enquanto sua refilmagem contém mais elementos de mise en scène que contribuem na narrativa ao decorrer do filme, dando dicas ao espectador sobre a verdadeira situação do personagem principal. Abre Los Ojos conta a história de César, um homem bem sucedido que vê em sua aparência a chave para conseguir o que quiser. César tem um relacionamento aberto com sua amiga Nuria, porém, após ser apre- sentado a Sofía, por meio de seu melhor amigo, Pelayo, se vê instantan- eamente apaixonado pela moça. Em um surto de ciúmes, perguntando a César o que seria felicidade para ele, Nuria causa, propositalmente, um acidente de carro que acaba por matá-la, deixando César com sequelas em seu rosto, o qual ele tanto cultivava. A partir desse momento sua vida começa a tomar rumos totalmente diferentes do que ele havia imaginado e, através de delírios e visões, ele descobre que vinha vivendo em uma realidade virtual construída sob medida para ele. A intenção de Alejandro era criar uma ficção científica sem muitos efeitos especiais, trabalhando apenas com o jogo de câmeras. O filme tra- balha com a desconstrução da linha que separa o sonho da realidade, sen- do difícil a distinção de onde um termina e o outro começa. Tal descon- strução é igualmente utilizada em sua montagem. Sem uma linearidade, ela nos revela pouco a pouco o que está acontecendo com a vida de César. A companhia Life Extension propôs a César um paraíso que ele próprio poderia construir. O que logo me fez associá-lo à lei da atração, tratada no documentário O Segredo (Drew Heriot, 2006). Isso porque o que sua mente pedia acabava acontecendo. Entretanto, nossa mente não lida apenas com os desejos conscientes ou pré-conscientes. Freud já falava sobre um inconsciente responsável por abrigar nossas lembranças traumáticas reprimidas. César, inconscientemente, pode ter começado a se sentir culpado pela morte de Nuria e isso explicaria o fato de ele passar a enxergá-la em Sofía, fazendo com que o paraíso se transformasse em 41