Hatari! Revista de Cinema #05 Ficção Científica | Page 27
sua amiga, para perto do buraco. No final do filme, ele volta a aparecer
quando o protagonista percebe que ele mesmo pode fazer sua vida após
a longa jornada até ali, esquecendo a crença no telefonema e se jogando
no seu medo, na descrença, no buraco negro. Além disso temos alguns
detalhes presentes no filme que ironizam a religiosidade, como a propa-
ganda da igreja do Batman que aparece ao início do filme, quando Leth
vai trabalhar. O que incomoda é o diálogo final entre Qohen e seu chefe
sobre o teorema, reiterando mais ainda essa dualidade presente no filme,
enfraquecendo-o como objeto artístico, devido a essa constante redun-
dância de informações.
Enquanto isso, Brazil, é uma obra mais completa e coesa, além de
fluído por conta das gags irônicas influenciadas pelo recente trabalho
do diretor com Monty Python. Além da crítica à automatização de tudo
por meio de máquinas e da burocracia enrijecedora e estúpida, temos
presente a alienação e a futilidade como temas apresentados de forma
pejorativa. Uma cena que exemplifica bem a maior parte dessas carac-
terísticas é a do restaurante, a qual nunca saiu da minha cabeça pela qual-
idade que ela apresenta. A mãe de Sam Lowry o convida para almoçar
em um restaurante chique e ele, por querer conversar sobre a promoção
de emprego que ela o tinha arranjado, aceita. De início, já temos ela en-
trando no restaurante sendo facilmente reconhecida pelo maître, Spiro, o
que nos faz perceber sua presença ser rotineira naquele restaurante. Isso,
juntamente com as roupas extravagantes e a conversa que ela inicia com
sua amiga sobre operação plástica demonstra o quanto essa personagem
é fútil. A burocracia se apresenta na hora em que Sam deve escolher um
prato para o almoço, pedindo aleatoriamente um “filé malpassado” para
dispersar o maître, sem sucesso, pois ele quer que Lowry fale o número
do prato, como está no protocolo do restaurante. A ação é finalizada, com
Spiro irritado, escolhendo pelo protagonista o prato que para ele será ser-
vido. Ao final da cena uma explosão ocorre no restaurante e todos à mesa
continuam conversando sobre frivolidades, sem fazer nada a respeito. O
fato é que, no próprio diálogo, se fala rapidamente e pejorativamente dos
terroristas, que, na realidade, são um grupo de rebeldes contra o governo
ditatorial dessa sociedade. Um biombo é colocado pelos funcionários do
restaurante atrás da mesa da madame Lowry para que a destruição que a
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