MAIO 2018 | 5
Entrevista
MESTRE JOSÉ ARAÚJO ESPECIAL
Como e quando é que surgiu a possibilidade de treinar Shorinji Kempo ? A vontade de praticar Shorinji Kempo remonta ao ano de 1985 . Por questões de fidelidade ao meu mestre de então , o mestre Francisco Gouveia , e porque na minha cabeça não entrava o cenário de continuar a praticar Karaté estilo Shotokai , com outro mestre que não ele , abandonei a prática já com a graduação de 1 dan , que demorou cerca de 10 anos a conseguir . Em conversa com um antigo praticante de Shorinji Kempo o Carlos Rosa , ele apresentou- -me o Shorinji Kempo e convenceu-me a experimentar , e já passaram 33 anos e alguns meses .
Qual foi a sensação de pisar pela primeira vez um tatami ? Quando é que aconteceu em competições nacionais e internacionais ? Talvez devido ao facto de a prática de artes marciais já não ser uma novidade para mim , de acordo com o respondido anteriormente , o início foi encarado com bastante serenidade e cautela . Tentei saber o máximo possível sobre a modalidade e mestres que a estavam a ensinar , pois já tinha dez anos de experiência nesta área , e tinha de saber muito bem onde me ia meter . Relativamente a representações , sendo eu um dos mais antigos praticantes em atividade e devido ao facto de só em 1990 se ter realizado o primeiro Embukai Nacional , muito embora de uma forma muito embrionária , nunca participei em embukais a nível interno . A nível de seleção representei Portugal por três vezes , em Osaka 1993 , Tóquio 1997 e em Paris 2001 . A partir de um determinado momento na nossa vida o que realmente importa , é o facto de podermos superar as nossas próprias espectativas e limitações , relegando para segundo plano os resultados finais alcançados . Esta sem sombra de dúvida é a vitória mais importante e que maior prazer me deu atingir , a minha própria superação e ficar a conhecer-me um pouco melhor .
Qual foi a evolução do Shorinji Kempo em Portugal ? O Shorinji Kempo em Portugal tem sofrido uma evolução lenta , mas segura . De ano para ano o número de praticantes tem vindo a aumentar , assim como o número de locais de prática . Não é ainda o ritmo de aumento desejado , mas é de forma sustentada e segura . Temos uma imagem a defender , e nós mestres , somos os fiéis depositários da confiança que a WSKO nos atribuiu como veículos transmissores das ideias e ideais do Fundador . É algo que não pode ser tratado de ânimo leve e sem censo , daí o por vezes não ser fácil uma maior expansão . Isto no que concerne a número de praticantes , no aspeto técnico o panorama é bastante diferente . Nas duas últimas décadas tem-se assistido a uma grande evolução técnica fruto do natural aumento de mestres a ensinar e do maior número de contactos a nível de estágios internacionais , visitas ao Japão que todos nós vamos tendo , o que permite um melhor conhecimento e consequentemente um melhor ensino .
Que fator motivacional o faz continuar a treinar / dar treinos diariamente ? Aqui tenho de recorrer a um chavão muito comum aplicado em várias situações de diferente índole .
O QUE REALMENTE IMPORTA , É O FACTO DE PODERMOS SUPERAR AS NOSSAS PRÓPRIAS ESPECTATIVAS E LIMITAÇÕES
Eu diria que o Shorinji Kempo é algo que de início se estranha e depois se entranha . Para mim à muito que deixou de ser uma mera modalidade ou atividade física , é algo que já faz parte mim e da qual sou indissociável . Este motivo por si só já seria suficiente para sustentar a minha continuidade , mas existe algo mais complexo , e quanto a mim de maior responsabilidade e … talvez beleza , que me empurra para continuar este percurso , chama- -se compromisso . Compromisso para com todos aqueles que ao iniciar a prática confiam em mim , e naquilo que lhes posso transmitir . Compromisso para com aqueles que me deram voto de confiança para dar início ao projeto de ensino .
5 - Sente que ainda tem muito para aprender ? Do ponto de vista do treino ou filosófico ? A prática desta modalidade , assim como qualquer outra arte denominada marcial , é de aprendizagem constante . De cada vez que há um praticante novo , há necessidade de retomar à origem e recomeçar da linha de partida . Cada praticante é único , e terá de ser uma nova aprendizagem acerca de uma nova personalidade de um ser diferente e que teremos de aprender a aceitar dentro de nós tal como já o fizémos dezenas , centenas de vezes com outros . O SHU-HA-RI é um processo permanente e constante . Há sempre algo de novo a aprender . No dia que pensar que já sei tudo , afasto-me , porque de certeza fui
ou serei ultrapassado e já nada terei a ensinar ou transmitir .
Existiu algum momento , na sua prática de Shorinji Kempo , em que lhe passou pela cabeça desistir ? Porquê ? Sim já algumas vezes , a quente , pensei parar com a prática do Shorinji Kempo . Nunca por motivos relacionados com a minha condição física ou mental , foram sempre motivos causados por terceiros dentro do núcleo do SK . Tenho uma grande paixão pelo que faço , e por vezes , reconheço , levo demasiado longe essa mesma paixão e penso que os outros também estão disponíveis e recetíveis à mesma intensidade de sentir , e não é verdade .
Como conseguiu conciliar os treinos com a sua vida familiar e com a atividade profissional ? Abdicou de algumas coisas de que hoje se arrepende ? Ui , esta é quentinha , em especial no que concerne ao nível familiar . Não foi , não é e não será fácil . A fórmula certa para estes casos não existe , a alternativa é tentar conciliar o melhor possível com cedências de parte a parte . Tudo o que abdiquei foi em consciência e sempre dentro dos parâmetros das cedências que falei anteriormente . Não há , nem pode haver , lugar a arrependimentos , pois estes não vão alterar o que já passou . Há que tirar ilações e tentar que aquilo que nos pode causar essa sensação de arrependimento não volte a acontecer .
Nestes anos todos de treinos e dedicação ao Shorinji Kempo , acha que ficaram coisas por fazer ? Sim , sem dúvida que existe essa sensação . Posso apontar um exemplo recente que espelha na totalidade a minha linha de raciocínio . Em 2015 foi realizado em Portugal um dos maiores , se não o maior ,
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