Fraternidade. Releitura civil de uma ideia que pode mudar o mundo FRATERNIDADE_MANIERI | Page 92

Maria Rosaria Manieri respectivamente na necessidade, no gosto e na intenção, nenhuma “tem vocação universal”. Tanto é que os homens pre- ferem praticá-la em círculos mais restritos. Eles são propensos a “constituir seitas, partidos, comunidades”. “Instituições louvá - veis” – afirma Kant – que “implicam, no entanto, fechar-se o coração humano a todos aqueles que estão fora da comunidade” e, “com exceção de poucos, cerrar o coração aos outros”. 31 O outro lado das relações entre os homens que se confiam à amizade, que, apesar de tudo, é “o máximo amor recíproco”, é o particularismo, o clientelismo, os privilégios, o sectarismo. Eis por que – exorta Kant – “moralistas e mestres deverão cuidar, tanto quanto possível, de apresentar os deveres de honra e bondade como deveres que implicam uma dívida e torná-los, em última análise, uma questão de direito”. 32 Não se trata, em outros termos, de ver como o egoísmo individual possa ser superado através de particulares afecções naturais que façam ir além do círculo da privacidade humana, como a compaixão, a complacência ou a benevolência; mas de legitimar a vitória sobre o egoísmo como princípio que, tendo seu fundamento na razão pura, já por si é negação dos estreitos limites em que o homem naturalmente se poderia encerrar e garantia estável para todos de liberdade. A própria virtude assume a exigência dos princípios, “os quais, quanto mais gerais tanto mais a tornam sublime e nobre”. Só a virtude que se apoia em princípios não é provisória, suscetível de mudar com a variação das circunstâncias, e só ela não cede à fragilidade das inclinações, não se acomoda à hipocrisia das convenções, não se entrega aos humores do temperamento, não se deixa condicionar pela ampla e multiforme expressão dos interesses particulares, 31 Ibidem. 32 Kant, Lezioni di etica, cit., p. 220. 90