Fraternidade. Releitura civil de uma ideia que pode mudar o mundo FRATERNIDADE_MANIERI | Page 126

Maria Rosaria Manieri
que se estrutura na separação entre sociedade civil e sociedade política . A primeira é a esfera concreta do homem que , como bourgeois , nela manifesta “ a imediata existência sensível individual ”, produzindo e reproduzindo-se sob as leis férreas do capital no quadro de relações sociais conflituosas . A segunda é a esfera própria do homem como citoyen , a esfera em que ele afirma a própria essência de animal social e celebra sua dignidade , mas só como “ pessoa alegórica , moral ”, abstraída das concretas determinações que os interesses sociais e a posição de classe produzem . A segunda é funcional à primeira como condição indispensável para que os indivíduos entrem numa relação social como a capitalista , que , para constituí-los como sujeitos da troca , deve pressupô-los na mesma determinação formal de possuidores de equivalentes . Assim , os homens conduzem ao mesmo tempo uma dupla existência : uma , no abstrato céu do Estado , no qual se reconhecem como irmãos , livres e iguais , através do valor da cidadania universal no âmbito do ordenamento jurídico ; outra , na terra da sociedade civil , na qual cada um age como homem privado em vista dos próprios fins pessoais e considera os outros homens como instrumentos para a obtenção destes fins . 34
Por uma parte , o Estado proclama a igualdade de todos os cidadãos , por outra permite e , antes , tutela com suas leis sua desigualdade social . Esta contradição determina o caráter , para Marx , profundamente limitado das constituições burguesas , uma vez que nelas a igualdade dos cidadãos e também , poder- -se-ia dizer , a relação fraterna entre eles , longe de encontrar concreta realização na sociedade , ficam relegadas ao âmbito dos princípios políticos abstratos .
34 K . Marx , Sulla questione ebraica , Milão , Bompiani , 2007 , p . 89 .
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