Fluir nº 4 - fevereiro 2020 | Page 5

milhares de subtis sensações, as cores, os cheiros, os paladares da mais ínfima das vivências. 2.Pertenço, contudo, a uma geração que se obrigou a medir a saudade e a nostalgia com certa desconfiança. Como aprendemos a desejar o futuro e a querer moldá-lo segundo os nossos sonhos, tudo quanto nos cheirasse a um compromisso afectivo com o passado, nos chegava repassado de culpa ou, pelo menos, de desconforto. Daí que a proposta do tema deste número, «Memória, Nostalgia», sobretudo vinda de quem veio, me tivesse imediatamente soado como a possibilidade de encarar sem medo o fascínio pelo encanto do passado que nos acena ao longe, e pelo encantamento com tudo quanto, nesse passado, cintila sempre tanto. Conto também, em poucas palavras, a história do nascimento do tema. Convidei Rui Bebiano a escrever alguma coisa para a Fluir anterior, a número 3. Bebiano escusou-se. Os prazos que eu indicava não eram compatíveis com os seus compromissos; lamentou, mas aquele não era o seu tempo para a Fluir. Fiz-lhe, então, uma contraproposta: poderia preparar colaboração para o número seguinte, este, o qual seria, assim, concebido em função do tema sobre que entendesse trabalhar? Agradou-lhe a ideia. Escaparam-se meses. Completámos a 3. Lançámo-la, num encontro de poucas pessoas, mas muita proximidade, afecto e prazer. Passaram ainda semanas. Terá certamente julgado que me esquecera. Ou ter-se-á esquecido ele próprio. Não esqueci. Reatei a comunicação. Mail para a frente, mail para trás, e o Rui confidenciou- me que os seus interesses naquele momento se prendiam com a beleza da memória e da nostalgia. Acertámos nesse instante o tema. 3. Alargando os convites, e já de tema no bolso, percebi cedo que a ideia conquistava com facilidade. Memória e nostalgia vinham ao encontro do que cada um dos Autores com quem falei sentia, ou pensava, ou a que se dedicava. Um misto de dor, em alguns casos, de alegria em outros casos, confluía em adesões que não precisavam ser negociadas. Completou-se, assim, um número particularmente belo da revista (embora a mão da Ana Cristina Marques se tenha empenhado em fazer da qualidade estética e digital da Fluir uma imagem de marca, número após número), pelo qual, como todas as vezes, só posso agradecer a todos quantos, por essas «páginas» adiante, teremos o prazer de ler. E que tutti quanti esses: Dulce Maria Cardoso, 5