milhares de subtis sensações, as cores, os cheiros,
os paladares da mais ínfima das vivências.
2.Pertenço, contudo, a uma geração que se obrigou
a medir a saudade e a nostalgia com certa
desconfiança.
Como aprendemos a desejar o futuro e a querer
moldá-lo segundo os nossos sonhos, tudo quanto
nos cheirasse a um compromisso afectivo com o
passado, nos chegava repassado de culpa ou, pelo
menos, de desconforto.
Daí que a proposta do tema deste número,
«Memória, Nostalgia», sobretudo vinda de quem
veio, me tivesse imediatamente soado como a
possibilidade de encarar sem medo o fascínio pelo
encanto do passado que nos acena ao longe, e pelo
encantamento com tudo quanto, nesse passado,
cintila sempre tanto.
Conto também, em poucas palavras, a história do
nascimento do tema.
Convidei Rui Bebiano a escrever alguma coisa para
a Fluir anterior, a número 3.
Bebiano escusou-se. Os prazos que eu indicava não
eram compatíveis com os seus compromissos;
lamentou, mas aquele não era o seu tempo para a
Fluir.
Fiz-lhe, então, uma contraproposta: poderia
preparar colaboração para o número seguinte, este,
o qual seria, assim, concebido em função do tema
sobre que entendesse trabalhar? Agradou-lhe a
ideia.
Escaparam-se meses.
Completámos a 3. Lançámo-la, num encontro de
poucas pessoas, mas muita proximidade, afecto e
prazer.
Passaram ainda semanas. Terá certamente julgado
que me esquecera. Ou ter-se-á esquecido ele
próprio. Não esqueci. Reatei a comunicação. Mail
para a frente, mail para trás, e o Rui confidenciou-
me que os seus interesses naquele momento se
prendiam com a beleza da memória e da nostalgia.
Acertámos nesse instante o tema.
3. Alargando os convites, e já de tema no bolso,
percebi cedo que a ideia conquistava com
facilidade. Memória e nostalgia vinham ao encontro
do que cada um dos Autores com quem falei sentia,
ou pensava, ou a que se dedicava. Um misto de dor,
em alguns casos, de alegria em outros casos,
confluía em adesões que não precisavam ser
negociadas.
Completou-se, assim, um número particularmente
belo da revista (embora a mão da Ana Cristina
Marques se tenha empenhado em fazer da
qualidade estética e digital da Fluir uma imagem de
marca, número após número), pelo qual, como
todas as vezes, só posso agradecer a todos quantos,
por essas «páginas» adiante, teremos o prazer de
ler. E que tutti quanti esses: Dulce Maria Cardoso,
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