EUFONIA Música no século XVIII | Page 13

música sacra e da corte POR CAROLINA LOURENÇO  Na história da música portuguesa, o reinado de D. José I fez florescer a ópera em Portugal como instrumento de propaganda do poder régio, em correlação com o processo de secularização da vida política e cultural. A música sacra foi provavelmente a área musical mais determinante em Portugal na segunda metade do século XVIII, atingindo um alcance relativamente superior do que a ópera junto dos diferentes estratos da sociedade. Vários fatores têm contribuído para que a nossa percepção da realidade histórico-musical desta época tenha sido moldada na óptica do espectáculo de ópera quer na corte, quer nos teatros públicos:um grande acontecimento associado ao enorme investimento de D. José I, no sentido de criar um verdadeiro estabelecimento operático de corte com a construção da Ópera do Tejo e a contratação dos melhores músicos, cenógrafos, arquitectos teatrais e bailarinos italianos da época.  A política pombalina implicava uma clara separação hierárquica e simbólica entre a Igreja e o Estado e pretendia diminuir o poder do clero (expulsão dos jesuítas, corte de relações com a Santa Sé, secularização da censura através da criação da Real Mesa Censória, etc.). Existe ainda o facto de dispormos de um importante estudo que nos traça o quadro da atividade operática em Portugal no século XVIII, ao contrário do que acontece com a música sacra, até aqui objcto de estudos raros e parciais. Na realidade, a primazia da ópera como instrumento de representação do poder régio, à semelhança do que sucedia noutras cortes absolutistas europeias, teve em Portugal uma vida curta, sendo interrompida pelo terramoto de 1755. Os espectáculos de ópera sofreram um interregno de oito anos e, depois disso, abandonou-se a ideia da criação de um teatro de Estado. Não houve uma reconstrução da Ópera do Tejo, pelo que a ópera passou a ser sobretudo um entretenimento de natureza semiprivada nos teatros régios da Ajuda, de Salvaterra e, mais tarde, de Queluz.  A cultura operática de corte é assim remetida para uma zona periférica relativamente aos centros de decisão política, passando a funcionar mais como diversão aprazível do que como dispositivo de exibição de poder. Pelo contrário, o cerimonial religioso e a sua respetiva componente musical eram indissociáveis do quotidiano. Logo a seguir ao terramoto foram tomadas medidas imediatas no sentido de garantir os Ofícios Divinos na Patriarcal ou nos templos que não tinham sido destruídos pelos abalos ou pelo incêndio que se seguiu. JANEIRO 2018 • EUFONIA | 11