GOLO REI
OUTUBRO 2025 REVISTA DRAGÕES camisola 9 vai guardar para sempre. Secretário recebe na direita, não na linha de fundo, mas próximo do vértice da área, e o cruzamento sai tenso, daqueles que pedem decisão no primeiro toque. Drulović assiste, Domingos ataca o espaço entre os centrais, recebe com um pé, roda num gesto curto e remata com o outro sem pedir licença. Ao minuto 90, quem já tinha abandonado as bancadas regressou e quem acreditou até ao fim abraçou o vizinho do lado. O FC Porto vira o jogo e começa o campeonato a ganhar.“ Foi o meu melhor golo”, seleciona Domingos entre mais de uma centena e meia de candidatos.“ Todo ele com muito efeito e bem trabalhado, deixando bem evidente a execução técnica e, acima de tudo, a velocidade de execução”. O contexto conferia ao jogo um certo peso de final. Bobby Robson, operado e em convalescença, tinha sido notícia horas antes: a recuperação corria bem e o presidente entrava no balneário para pedir uma vitória para o homem que tinha transformado os treinos em aulas do mais genuíno futebol de ataque.“ Ganhar por 1-0 não chega”, repetia o inglês.“ Para ele, que era uma verdadeira inspiração, o futebol só tinha sentido com golos. O trabalho diário era uma animação, motivava-nos, e isso percebiase no jogo”, lembra o avançado de Leça da Palmeira. O resultado do clássico tinha, por isso, destinatário predefinido:“ Ficámos a par do êxito da cirurgia e unimo-nos para lhe dedicarmos a vitória”. Com o treinador inglês, Domingos vive o ponto alto de 14 temporadas em que só vestiu as camisolas do FC Porto e do
Esta história também vive no ecrã. Veja a versão audiovisual nas plataformas oficiais do FC Porto e no Porto Canal.
“ Foi o meu melhor golo, todo ele com muito efeito e bem trabalhado, deixando bem evidente a execução técnica e, acima de tudo, a velocidade de execução.”
Tenerife: dois anos, 60 golos, parceria afinada com Kostadinov, pressão alta e obsessão pelo último passe.“ Tinha ao meu lado um jogador muito rápido, também ele bom finalizador e com uma forma de atuar muito diferente dos avançados de agora”, recorda, com nostalgia. Hoje ainda o interpelam na rua para lembrar os estragos daquela dupla diabólica que se sentia em Alvalade como se estivesse em casa“ Houve três anos seguidos em que fiz golos em casa do Sporting, mas não havia ali nenhuma motivação extra ou fórmula especial. Aconteceram todos naturalmente”, garante. A equipa respirava futebol ofensivo e Domingos exalava perfume. Talvez por isso o lance pareça simples quando ele o descreve, embora ali nada seja banal. O primeiro toque orienta a bola para além do alcance de um dos centrais, a rotação surpreende o segundo e o remate sai antes da leitura do guarda-redes. É estética com propósito, o género de golo que explica uma carreira: instinto, técnica e coragem para decidir quando o jogo pede uma assinatura.“ Foi dar a volta ao jogo, ao resultado e dar a volta ao corpo todo”, resume, orgulhoso.“ Aquele golo pôs o estádio todo em delírio”. No fim,“ quando alguns adeptos já deixavam o estádio”, aquele momento vale mais do que três pontos. Valida uma ideia, ilumina uma época e deixa uma dedicatória coletiva a Bobby Robson. O apito final junta a equipa no meio-campo e nas bancadas o rumor transforma-se em certeza: o campeão voltou.“ Foi a minha melhor época”— e este foi o golo que a explicou.
Anatomia do golo
Competição Liga Portugal, jornada 1 Jogo FC Porto-Sporting, 2-1 Estádio Estádio das Antas Data 20 de agosto de 1995 Minuto 90’
Autor Domingos Paciência Tipo de golo receção de pé esquerdo, meia-volta rápida e finalização de pé direito
Assistência Drulović Relevância
golo da vitória dedicada a Bobby Robson
33