Dragões #466 Set 2025 | Page 37

FUTEBOL
SETEMBRO 2025 REVISTA DRAGÕES

A renovação não é só protocolo, é opção desportiva com propósito. Aos 28 anos e depois de 194 jogos pelo FC Porto, Pepê consolidou um perfil que acrescenta soluções a diferentes momentos do jogo e a vários desenhos táticos. Atuou nos três corredores, ligou sectores, deu largura quando foi preciso esticar o campo e baixou para fechar espaços em fases de contenção. O traço comum é simples de enunciar e difícil de executar: intensidade com critério. Os números ajudam a fixar a trajetória. Na época de estreia somou seis golos e seis assistências em 42 jogos( 23 como titular, 19 como suplente utilizado) e fechou a temporada com a dobradinha. No segundo ano duplicou minutos, tornou-se o jogador com mais utilizações( 55) e alinhou três troféus( Supertaça, Taça da Liga e Taça de Portugal), mantendo o registo de golos e chegando aos dois dígitos nas assistências. O terceiro capítulo trouxe nova Taça de Portugal, uma aproximação ao duplo-duplo( oito golos, dez assistências), a estreia pela seleção brasileira e a chamada à Copa América. Em 2024 / 25, voltou a levantar a Supertaça— o sexto título no Clube— e ultrapassou marcas de referências recentes: Pedro Emanuel( 178), Mário Jardel( 175), Bruno Alves( 174) ou Hulk( 170). Não é apenas longevidade, é consistência com influência. O contexto atual reforça a decisão. A chegada de Francesco Farioli trouxe sessões com intenção e um ritmo que puxa pela equipa até ao limite. Pepê sintetiza:“ Está a ser incrível trabalhar com o mister, a exigência é muito grande e obriga-nos a treinar sempre no máximo”. A identidade competitiva pede reação rápida à perda, pressão coordenada, circulação com propósito e o brasileiro cabe nesse guião: aproxima linhas, encontra o passe que acelera ou o toque que pausa, interpreta bem as zonas de receção e dá continuidade às jogadas. Até sofrer uma lesão ocular num exercício de espaço reduzido no Olival, foi titular em todos os jogos particulares e oficiais da época.

“ Dedicação, insatisfação, reflexão e regressar mais forte: é também por isto que o recompensamos.”— André Villas-Boas

Há, porém, um tema que o camisola 11 não contorna: na temporada passada parte da opinião pública questionou o compromisso do jogador e o próprio assumiu a autocrítica:“ Sei que não venho de uma boa época, tive problemas pessoais que influenciaram o que eu era, dentro e fora do campo. Precisava de voltar a ser o Pepê que sempre fui”. Agora escolhe a resposta mais difícil: competir melhor, porque a renovação não é um prémio de conforto, mas sim um pacto de exigência: é o clube a dizer que acredita na resposta e o atleta a comprometer-se com um padrão de rendimento no treino e no jogo.
Da presidência a leitura veio com nitidez. André Villas-Boas“ não podia estar mais satisfeito” com a continuidade de quem“ tem dado muito e quer continuar a dar muito”, sublinhando quatro ideias que interessam tanto quanto as métricas: dedicação obrigatória em cada jogo, insatisfação quando não basta, reflexão e autocrítica, regressar mais forte e focado. O lado humano ajuda a decifrar o momento. Pepê fala de maturidade e de como a paternidade o tornou“ mais responsável, dentro e fora do campo”. No balneário, a amizade com William Gomes ilustrou coesão em dois gestos simples: as dedicatórias dos golos que marcou ao Casa Pia e ao Sporting disseram mais sobre união e liderança discreta do que qualquer estatística. Há ainda objetivos pessoais que alimentam a ambição coletiva, assumiu o internacional canarinho:“ Chegar aos 200 jogos por um clube histórico como o FC Porto é uma honra”. E há metas que movem balneários inteiros:“ Ganhar o campeonato é especial. A forma como se vive esse momento é única”. O regresso à seleção do Brasil está no horizonte, mas com uma premissa óbvia: jogar aqui ao melhor nível para merecer voltar lá. Em resumo, renovar com Pepê é fixar numa peça aquilo que a equipa quer como padrão: versatilidade, criatividade que resolve e disciplina que sustenta. É uma decisão que preserva qualidade provada, alinha ambição e envia uma mensagem para dentro e para fora: aqui, talento é método e método é jogar para ganhar.
37