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O meu interesse pelos temas de Gênero e Sexualidade surge a partir da reflexão crítica à respeito do ambiente artístico no qual eu tive minha formação: o universo do ballet clássico. Marcadamente normativo, com delineamentos claros de papéis para os gêneros e classes sociais, com regras rígidas, muitas vezes inflexíveis e excludentes, aquele universo foi gerando em mim uma série de incômodos. Ao longo dos mais de 20 anos de estudos práticos e teóricos dessa técnica, em especial, a partir do momento que assumo o papel de professor em academias de ballet e projetos sociais, função que venho desempenhando há dez anos. Lembro que eu e meus colegas de classe, na sua grande maioria homossexuais assumidos, escutamos por diversas vezes renomados mestres da técnica clássica proferirem o discurso: " não importa o que você faz lá fora, mas dentro da aula, nos testes ou no palco tem que ser homem ". Entendo hoje em dia que os professores pediam para que encenássemos uma“ performance de gênero” como definido por Butler( 2010) quando estivéssemos atuando na representação dos príncipes, presentes nos ballets de repertório. Apesar de minha contínua dedicação à técnica do ballet, os incômodos e a sensação de inadequação àquele universo, levaram--me, contraditoriamente, a buscar referências diversas em outros ambientes, o que me moveu a iniciar uma pesquisa artística, em 2011, sobre obras de artistas que dialogavam com o tema gênero e sexualidades em congruência com os estudos queer. Com o intuito de aproximar tais conhecimentos do meu fazer artístico, comecei a idealizar o que eu nomeei de uma releitura queer do ballet Giselle, onde eu deslocava o tradicional personagem homônimo da peça original, tentando aproximá-lo da discussão contemporânea sobre gênero, no qual homens e mulheres são constantemente obrigados a refletir sobre seus papéis sociais ao invés de apenas reproduzir modelos pré-prontos. O que é ser homem, o que é ser mulher em pleno 2017? O que é“ permitido” a um corpo masculino e / ou feminino? Em se tratando especificamente do ballet clássico, o que cada personagem pode
38 UM BALLET PARA QUESTIONAR O BINÁRISMO OPOSITIVO HOMEM / MULHER