Paulo maia
cenários eram em tudo semelhantes ao passado dos meus
tios. Isto fazia de cada episódio numa pequena viagem
nostálgica. Nunca mais desdenhei das novelas...
Diferente do que se passa na cidade, o ambiente de
vila transforma um acontecimento destes num evento social.
No velório compareceram um elevado número de pessoas,
vindas de todas as vilas vizinhas. Fizeram-me cumprimentar
toda a gente, e todos me foram apresentados como primos.
Lembro-me das expressões faciais de todos os
elementos da família. Do mais completo desnorte, da tristeza,
da saudade e do vazio que todos sentiam. Lembro-me do
meu primo, que na altura era um verdadeiro bad boy, e um
dos meus ídolos de juventude. De cara lavada em lágrimas,
as palavras dele eram simples. “Foi-se o meu pai”.
Eu era muito novo, demasiado ausente (morava
em Lisboa), para ter uma relação próxima com o tio
Américo. A dor de todos, no entanto, não deixava de me
tocar, e senti-me culpado por não chorar, como faziam os
primos.
Pela primeira vez, a morte era uma presença real
na minha vida. Era agora confrontado com a estranha
sensação de ausência. Ainda hoje está muito presente na
minha memória, e é das recordações mais marcadas que
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