Prolixa e nero
«M
ulher avantajada, experienciando
os últimos prazeres da juventude,
disponibiliza-se para momentos
únicos.» Ainda não acabara de ler o anúncio no jornal e já
Orestes se apressava a contactar a prostituta. Se bem que se
viesse a arrepender, não só por ter gastado dinheiro que lhe
fazia falta, por exemplo para comer, com um camafeu
excessivamente feio para merecer sequer ser tocado com a
ponta da unha, mas também por ter atraiçoado uma vez mais
a sagrada instituição que era a sua relação com Sofia. Uma
prostituta afigurava-se-lhe na altura como a cura ideal para
os desgosto nascidos do desprezo a que sem explicação
aparente a vida, o destino, o fado, o que se quisesse, o
votara. A prostituta do anúncio morava num bairro
degradado, pejado de drogados, cães sarnentos, gordas
grotescas de sapato de salto exageradamente alto, meias,
ligas, tatuagens de golfinhos, âncoras, sóis, corações
atravessados por setas estampadas em ombros, braços,
pernas, velhos alienados ou se não alienado histéricos,
bêbedos, cirroses andantes, miúdos fumadores/passadores de
haxixe camuflados pelo gangue, alcateia de bonés, correntes,
calças largas, fios, pulseiras, anéis de ouro, faces sugadas
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