Detectives Selvagens 0 - Julho 2014 | Page 85

O HOMEM QUE UM DIA PAROU melhor, mesmo sem razões aparentes para tal. Já Lurdes crescera com uma certa revolta no seu coração, fruto não só de muito gozo de que tinha sido alvo na escola à conta da imobilidade do pai mas, acima de tudo, revoltava-a a sensação de ter sido preterida por algo sem explicação, por uma decisão que considerava egoísta de quem devia ser o seu pai, mas havia preferido ser outra coisa qualquer sem nome. No entanto, o tempo foi passando e apagando a mágoa, pelo menos da forma como esta se manifestara nos primeiros tempos. Foi por isso sem grande estranheza que mais tarde não faltou quem a visse a conversar na Praça, sentada junto ao seu pai. Ninguém sabia muito bem que tipo de conversas eram aquelas, pois só Lurdes falava, mas acreditava-se que Jorge ia respondendo com o velho esquema das piscadelas de olho. Ainda assim, uma ou outra vez Lurdes afastava-se a chorar visivelmente incomodada, não seria certamente fácil ser adolescente e ter o pai numa situação assim mas gradualmente, conforme se ia aproximando da idade adulta e também quando foi estudar para fora, as conversas tornaram-se mais esporádicas mas substancialmente mais longas. O conteúdo das mesmas, esse continuo