vermos a mídia enaltecendo os
corpos magros e definidos.
O melhor exemplo que pode-
mos dar para explicar como as
características físicas têm mais
relevância que as intelectuais ou
qualquer outra é o caso da ex-
-presidente Dilma Roussef. Ela
foi chamada de “botijão de gás”
pela roupa que vestia durante a
sua posse, em 2015. Indepen-
dentemente do que ela fez ou
tenha dito naquela cerimônia,
o seu biótipo foi o que chamou
mais atenção da população e de
certos veículos de mídia.
Assim como Dilma, todas as
mulheres são julgadas o tempo
inteiro, porém nem sempre elas
possuem apoio ou respaldo das
autoridades. A professora de Di-
reito da Universidade Federal
de Mato Grosso, Thaísa Held,
explica que mesmo sabendo que
os casos ocorrem, a gordofobia
ainda não é enquadrada como
um crime. “Sabemos que o Di-
reito nem sempre acompanha
os anseios sociais, não havendo
até o momento a normatização
da gordofobia, embora saibamos
que os casos ocorrem cotidiana-
mente, seja em relações sociais,
afetivas ou de trabalho.”
Entretanto, segundo ela, é
possível considerar que o orde-
namento jurídico dá respaldo
a quem sofre com esse tipo de
preconceito: “por exemplo as
ações judiciais indenizatórias
por dano moral onde o adjetivo
‘gorda’ feriu a honra e a dignida-
de de quem sofreu tal atribuição
pejorativa”, explica a professora.
Em 2012, um menino de
apenas 12 anos se suicidou em
Vitória, no Espírito Santo, por
não suportar mais ser vítima de
bullying na escola. As crianças
cercaram o garoto e começaram
a hostiliza-lo. Depois de três
anos sofrendo com o preconcei-
to, ele se enforcou com o cinto
da mãe assim que chegou em
casa.
Mesmo com a carta que o
menino deixou aos pais falan-
do que ele não entendia porque
sofria esses ataques e pedindo
desculpas pelo ato, a polícia não
confirmou se a motivação do
suicídio foi mesmo bullying.
Casos como esse vêm se tor-
nando cada vez mais comum,
principalmente na adolescên-
cia. A youtuber Maíra Medei-
ros ficou conhecida pela forma
bem-humorada em que trata as
diferenças de gêneros em seu
canal, o “Nunca te pedi nada”.
Para ela, a superação de tudo
que sofreu na adolescência só
veio quando aprendeu a aceitar
e amar o seu corpo.
Feminista e disposta a ajudar
as pessoas a confiarem mais em
si, a youtuber afirma que é preci-
so parar de pensar que alguém é
melhor ou pior por ser gordo ou
magro. “Todo mundo diz que o
bullying só acontece na infância
e na adolescência, mas as pes-
soas podem ser cruéis quando
crescem. Tudo bem se o homem
for gordo, o julgamento do corpo
só acontece com a mulher”, de-
sabafa a youtuber.
Os casos são mais comuns
do que podemos imaginar e isso
pode acarretar em problemas
psicológicos e sociais irreversí-
veis. “Não cheguei a ter seque-
las físicas, mas já tentei tirar a
vida não foi uma ou duas vezes
só. O meu emocional nunca foi
estabilizado e meu psicológi-
co só foi ficando mais abalado.
Houve um tempo em que eu
não saia de casa com medo do
que eu poderia escutar e ver
na rua. Foram meses isolada do
mundo”, desabafa a estudante
que não quis ser identificada.
O anonimato se torna co-
mum para essas pessoas que se
sentem à margem da sociedade.
Mesmo aprendendo a aceitar
o seu corpo, a estudante conta
que já sofreu muitos preconcei-
tos e por isso não quer se expor
mais.
Como no Brasil não há lei
específica para punir discrimi-
nação por gordofobia, esse tipo
de atitude pode ser enquadra-
do como crime de injúria e vio-
lência contra a mulher. A pro-
fessora de Direito Thaísa Held
explica que pelo artigo 140 do
Código Penal, quem comete o
crime de injuria tem a intenção
de ofender a dignidade ou o de-
coro. “Nesse sentido, a interpre-
tação da lei penal pode incluir
a gordofobia, pois a intenção de
quem pratica é diminuir, ofen-
der a dignidade de outrem”.
Nesse mesmo sentido, pela
Lei Maria da Penha, qualquer
conduta que cause dano emo-
cional e diminuição da auto-
estima é considerada violência
psicológica. A violência moral é
entendida como qualquer con-
duta que configure calunia, di-
famação e injúria. Assim, a lei
Maria da Penha reconhece a
gordofobia como violência psi-
cológica e moral.
“Não deixe ninguém dizer
que você não deve ou não pode
fazer algo porque você é mu-
lher ou porque seu corpo não
se enquadra no que eles julgam
perfeito. A gente precisa falar
pra que possamos ser ouvidas”,
constata a youtuber.
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