(COM)POSSIBILIDADES:OS 50 ANOS DO MAIO DE 68 com-possibilidades_os_50_anos_do_maio_de_68 | Page 63
Norman Roland Madarasz
vestia de vermelho, não eram todos estudantes de esquerda que
compactuam com a classe operária. Se ainda hoje, a mídia que
comemora 68 na França se concentra sobre a figura do estudan-
te franco-alemão Daniel Cohn-Bendit, o líder do Movimento
situacionista do 22 de março (e eleito deputado no Parlamento
da União Europeia), a posteridade do acontecimento força a
considerar uma consequência menos celebrada. No maio de
1968 de Paris, quem assumiram os holofotes, e cujas fotos ainda
dominam as comemorações, são principalmente os homens
brancos heterossexuais. A massa movente, ao contrário, era
composta de mulheres, gays, lésbicas, negros, imigrantes ma-
grebinos e outras subjetividades ainda sem nome.
Com – ou sem – possibilidades, maio (e junho) de 1968 (em
Paris) era um gaio acontecimento agora fixado na história, mas
não necessariamente na sua dimensão acontecimental. A pri-
meira sequência acontecimental não existe, uma segunda, que se
reconfigura por meio da hipótese comunista, tenta se prolongar.
Qualquer que seja a primeira história, ou a narrativa que a
incorpora, a sua comemoração festiva que, conforme Cohn-
-Bendit, pôs fim à ideia de revolução, se perpetua em outras
formas. De uma festa, todos gostam de se lembrar. Na França,
o acontecimento inteiro se saldou por menos de dez mortos.
Quando se compara aos Estados Unidos em 1968 e às sangren-
tas manifestações na convenção do Partido Democrático em
Chicago, após os tumultos nas inner cities em consequência
do assassinato de Dr. Martin Luther King, Jr., sem esquecer o
ataque racista da cidade de Detroit em 1967, e especialmente
a invasão e bombardeamento do Vietnã do Sul, do Norte e da
Camboja, ou à invasão soviética da Tchecoslováquia para pôr
fim à primavera de Praga, ou ao massacre dos estudantes na
Cidade de México na noite do Tlatelolco dez dias antes do início
dos jogos olímpicos, ou às torturas e às mortes que seguirão o
decreto fascista do AI 5 em dezembro e a atuação do torturador
Carlos B. Ustra no Brasil, é fácil comemorar O Belo Mês de Maio,
e até ficar melancólico porque a Revolução não deu certo. Serve
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